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José Queirós continua a falar-nos do seu tempo de menino
As nossas armas de brincar eram os “trabucos”, feitos de pau de sabugueiro que íamos cortar atrás dos quintais. Extraíamos o miolo do pau e ficava um canudo oco. As nossas balas eram buchas feitas de linho. Soprando, a arma atirava a alguns metros de longe, e, assim, metíamos medo uns aos outros.
Fazer um pião de um pau de carrasqueira, ou cortar um pau de giesta e aguçá-lo dos dois lados para fazer a xona para os jogos, ou fazer os assobios de cana e as relas na quaresma, ou fazer um "picachão", tudo era fruto da nossa habilidade, pois não havia brinquedos a vender. O canivete era, para nós, a ambicionada ferramenta, mas custava dinheiro, e nem sempre se conseguia. E quando se achava algum, como aconteceu comigo certa vez na Fonte Robre, era uma grande alegria.
A minha irmã, Maria Augusta, morreu com 14 anos. Tenho uma vaga memória desses dias, mas acredito que a minha mãe deve ter sofrido muito. Naquele tempo parece que a morte era uma coisa mais natural, convivia-se mais de perto com ela. Morria-se em casa, aceitava-se o facto como um desígnio da Providência.
Naquele tempo, a pouca assistência médica, a pouca higiene, a má alimentação, tudo contribuía para apressar o fim. Eu lá escapei, mas também me lembro de ter sido visto pelo médico, deitado ao canto da sala, do lado direito, numas mantas estendidas. Eram as tais febres intestinais do tempo estival. E com uma doença denominada pneumónica, em 1918, ainda me lembro de morrer tanta gente, famílias quase completas, tinha eu na altura seis anos.
Naquele tempo, no Verão, sobretudo no mês de Agosto, era uma "limpeza". Até se dizia quando morria um anjinho: "Coitadinho, agostou-se". Recordo-me de ver morrer o Davide: pediu água à mãe dele, e foi a última que bebeu.
E, com uma diferença de 17 anos do António e uma diferença de 10 do José, nascia o nosso irmão Luís . Isto aconteceu depois de o nosso pai ter vindo da Argentina a última vez. A minha mãe tinha mais de 45 anos, e na aldeia toda a gente ficou espantada com o nascimento deste filho serôdio.
continua
domingo, 9 de maio de 2010
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