quinta-feira, 1 de julho de 2010

Recordações (12)

Emigrar!


Como as despesas a aumentar, comecei a ver que não ia ser fácil aguentar o barco, e fui pensando em emigrar para África. Este era o caminho que muitos escolhiam. Havia muitos que saíam, e o meu irmão Luís, terminado o serviço militar, já tinha emigrado para Moçambique, e isso serviu para aguçar ainda mais o meu desejo de fazer o mesmo. Mas era preciso a tal "carta de chamada" sem a qual não era autorizada a saída para África.

Aida acarinhava a ideia, animava-me e incentivava-me. A oportunidade surgiu através de uma prima sua, irmã do Augusto Cavaleiro da Mata de Lobos, que estava casada com um tal Aníbal Madeira, homem que tinha grandes negócios em Angola, e era sócio de uma tal firma Madeira e Marques com sede em Luanda.

Falou-se com aquela gente, e lá chegou a carta de chamada. Depois trataram-se os papéis e aprazou-se o dia da partida. Na noite anterior praticamente não dormi. Saí de casa e deambulei pelas ruas, interrogando-me se não seria essa a última noite que passeava na aldeia. Fui ao palheiro acendi uma candeia que eu próprio tinha improvisado com uma torcida de pano mergulhada num frasco de "Ceregumil". E, como se estivesse a despedir-me, olhei para os magros pertences da lavoura, e para o porco que era toda a riqueza de animais que nos restava.

A mala levava coisa pouca e já estava preparada: uma fatiota, umas mudas de roupa interior, umas camisas, e pouco mais. Numa taleiga de pano, já Aida tinha preparado e arrumado a merenda à base de pão, queijo, umas chouriças, e uma garrafa de vinho. Nem ao menos uma fotografia de Aida e das crianças para lembrança. Naqueles tempos, não se tinha possibilidade de ter estas coisas.

No manhã do dia seguinte, juntou-se um grupo de pessoas à nossa porta, e lá fomos formando um procissão até à Nave, que fica no limite da povoação. Aí fizeram-se as despedidas da mulher e dos filhos. E montado na burra preta da minha mãe, lá fui eu e uns quantos (que haveriam de voltar para S. Pedro com a burra!), a caminho de Vilar Formoso onde iria apanhar o comboio para Lisboa.

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