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No inverno, com as noites a chegar cedo, passava-se o serão, com uma luz que ia escasseando à medida que o fumo ia tornando mais negra a chaminé do candeeiro de petróleo, à volta da lareira que se tinha acendido para fazer a ceia .
Na nossa família não se saía, em regra para casas alheias, nem durante o dia nem ao serão, salvo para a casa dos padrinhos Norberto e Lucília que não era uma casa alheia, mas mais uma extensão da nossa própria casa e eles, sem qualquer ligação de sangue, foram sempre os segundos pais que tivemos a sorte de ter.
O serão na nossa casa era, por sua vez, concorrido normalmente por mulheres. Para além da madrinha Lucília, da avó Cândida e de algumas vizinhas apareciam muitas vezes a prima Sara e a ti Maria Forneira que era uma viúva precoce com uma língua afiada e de quem nós, os garotos, gostávamos porque contava, na nossa presença, histórias, às vezes picantes, que as outras evitavam contar.
Não era necessário qualquer pretexto para aparecerem, mas o serão era muitas vezes aproveitado para a nossa mãe ler e responder a cartas que haviam recebido de filhos ou familiares ausentes.
A intimidade e cumplicidade eram de tal forma que na resposta às cartas não se estabelecia qualquer diálogo, como faziam em regra as pessoas que respondiam por outras. A ti Aida fazia totalmente a carta de sua própria cabeça e no fim lia-a em voz alta à interessada que dava sempre o seu acordo.
Mas o que distinguia os serões na nossa casa, relativamente à generalidade das outras lá da terra, era aquilo que hoje poderíamos chamar as novelas da noite.
Havia uns livros deixados pelo ti Manel Sardinha, pai da madrinha Lucília, que a nossa mãe resolveu ler. E lia-os em voz alta ao serão, à luz frouxa do candeeiro, para os assistentes que ouviam algumas páginas por dia com o mesmo entusiasmo que passados uns anos viriam a ter as novelas na rádio e na televisão.
Quando a cabeça começava a “pesar figos” terminava-se o capítulo e continuava-se a leitura no dia seguinte.
Éramos ainda bastante pequenos, mas acompanhávamos avidamente o enredo daqueles romances que às vezes não compendiamos muito bem. Tenho ainda na memória figuras e episódios de alguns romances, em particular “A Execução dos Távoras” e “A Filha Maldita”.
Armando
sexta-feira, 31 de julho de 2009
Album (3)
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Casamento de Fátima e Elias
Foi no dia 29 de Junho de 1957, um sábado. O casamento realizou-se na capela da Sra. do Mosteiro. Na fotografia destaca-se a figura imponente e patriarcal do Tio Porfírio ao lado da tia Raquel. Estão as primas Jóia, Fernanda e, naturalmente, os noivos. Do lado direito a minha mãe, e eu no chão.
Duas outras pessoas, não consegui identificar, mas vim a saber em Almeida tratar-se do Tó Sousa, que transportou os noivos, e do padre Manuel, que celebrou o casamento
O Tio Porfírio tinha uma loja em Almeida que vendia tudo, era muito organizado, e anotava tudo o que gastava. Disse-me uma vez a Alcina que plantava batatas na Mangada, mas só as começava a gastar em casa, depois de ter recolhido para vender aquelas que tinha semeado.
Tanto o tio Porfírio como as primas tinham grande amizade pela nossa mãe. Nós entrávamos na casa de Almeida com muita deferência, e sabíamos que tínhamos de beijar o tio Porfírio na testa. Esta casa era, para nós, um deslumbramento, até porque tinha uma casa de banho.
O Tio Porfírio escreveu parte das suas memórias num livrinho chamado "Espelho de Bondade" que ele dedica à primeira esposa, Luísa, mãe das nossas primas. Muitas das histórias da nossa família aprendia-as eu nesse livro.
Luís
Casamento de Fátima e Elias
Foi no dia 29 de Junho de 1957, um sábado. O casamento realizou-se na capela da Sra. do Mosteiro. Na fotografia destaca-se a figura imponente e patriarcal do Tio Porfírio ao lado da tia Raquel. Estão as primas Jóia, Fernanda e, naturalmente, os noivos. Do lado direito a minha mãe, e eu no chão.
Duas outras pessoas, não consegui identificar, mas vim a saber em Almeida tratar-se do Tó Sousa, que transportou os noivos, e do padre Manuel, que celebrou o casamento
O Tio Porfírio tinha uma loja em Almeida que vendia tudo, era muito organizado, e anotava tudo o que gastava. Disse-me uma vez a Alcina que plantava batatas na Mangada, mas só as começava a gastar em casa, depois de ter recolhido para vender aquelas que tinha semeado.
Tanto o tio Porfírio como as primas tinham grande amizade pela nossa mãe. Nós entrávamos na casa de Almeida com muita deferência, e sabíamos que tínhamos de beijar o tio Porfírio na testa. Esta casa era, para nós, um deslumbramento, até porque tinha uma casa de banho.
O Tio Porfírio escreveu parte das suas memórias num livrinho chamado "Espelho de Bondade" que ele dedica à primeira esposa, Luísa, mãe das nossas primas. Muitas das histórias da nossa família aprendia-as eu nesse livro.
Luís
Os bons malandros do Liceu (2)
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Do grupo dos colegas do Liceu, o Carvalheira era o mais erudito. A alcunha, que ainda guarda, era "Isaac", talvez pela postura patriarcal que nos inspirou. O Isaac é um homem sensível, um poeta, por vezes desadaptado da realidade como todos os poetas. Escreve num português cristalino, com um estilo elegante e sóbrio. Uma amizade que o tempo só serviu para fortalecer.
Carvalheira fala da Ti Aida
A primeira vez que encontrei a TiAida foi na pensão Guardense, ali atrás do muro dum jardim com tílias, numa rua a subir. Competia-me fazer, no salão do liceu, um exame de transição. Para quem o não souber, era um género de purgatório em duas folhas de stêncil lilás titubeante, por onde tinham que passar os trânsfugas como eu, que o divino chamara, mas não quisera escolher. E entre fanerogâmicas e monocotiledóneas tudo acabou em bem.
Depois vivi um ano lá em casa, numas águas-furtadas do largo das camionetas. E comecei a ajustar o passo com o mundo, que vinha desacertado. Carregava às costas o conflito nunca resolvido entre o século e o claustro, de que o resto da malta nunca ouvira falar. E o pouco que se podia fazer aconteceu ali.
O inverno rangia os dentes no vidro da clarabóia, e eu despejava a água na bacia esmaltada mas nem molhava a ponta do nariz. Mais tarde ouvi dizer que estas coisas nos marcam a vida, mas não é verdade. O que nos marca a vida são mais os banhos da alma do que os banhos do corpo.
Isso foi há tantos anos que já nem me lembra quantos. Mas foi preciso esperar pela era dos blogues para conhecer melhor a TiAida. Que era uma mulher de prendas, e de modos, e deixara para trás as luvas e o chapelinho. Mas ela levara tão a sério as opções que fez, que nada disso se via. E eu tinha apenas intuições, palpites, a gente aprende a vida a comparar o que vê. Sempre a vi livre e segura, macia e tolerante. Muito mais não sabia.
O que nela mais apreciei, e melhor usufruí, foi o homem que teve e os filhos que criou. Sei hoje que era ela o pão daquilo tudo. Da inteligência do homem, da sua argúcia lúcida, do modo como ficava, pensativo, a fazer esperas à vida, às vezes rangendo os dentes. O Ti Queirós soube sempre donde vinha o mal, que é o saber maior que pode haver.
Eu nunca cultivei invejas de ninguém, mas tive tentações disso. De ter inveja daqueles a quem tocou esta mãe. A vida foi-lhe afinal muito mais dura do que eu alguma vez imaginei. Mas nunca lhe vi nem um lamento, nem um destempero, nem uma cedência. É essa a pedra de toque da condição humana.
Jorge Carvalheira
Do grupo dos colegas do Liceu, o Carvalheira era o mais erudito. A alcunha, que ainda guarda, era "Isaac", talvez pela postura patriarcal que nos inspirou. O Isaac é um homem sensível, um poeta, por vezes desadaptado da realidade como todos os poetas. Escreve num português cristalino, com um estilo elegante e sóbrio. Uma amizade que o tempo só serviu para fortalecer.
Carvalheira fala da Ti Aida
A primeira vez que encontrei a TiAida foi na pensão Guardense, ali atrás do muro dum jardim com tílias, numa rua a subir. Competia-me fazer, no salão do liceu, um exame de transição. Para quem o não souber, era um género de purgatório em duas folhas de stêncil lilás titubeante, por onde tinham que passar os trânsfugas como eu, que o divino chamara, mas não quisera escolher. E entre fanerogâmicas e monocotiledóneas tudo acabou em bem.
Depois vivi um ano lá em casa, numas águas-furtadas do largo das camionetas. E comecei a ajustar o passo com o mundo, que vinha desacertado. Carregava às costas o conflito nunca resolvido entre o século e o claustro, de que o resto da malta nunca ouvira falar. E o pouco que se podia fazer aconteceu ali.
O inverno rangia os dentes no vidro da clarabóia, e eu despejava a água na bacia esmaltada mas nem molhava a ponta do nariz. Mais tarde ouvi dizer que estas coisas nos marcam a vida, mas não é verdade. O que nos marca a vida são mais os banhos da alma do que os banhos do corpo.
Isso foi há tantos anos que já nem me lembra quantos. Mas foi preciso esperar pela era dos blogues para conhecer melhor a TiAida. Que era uma mulher de prendas, e de modos, e deixara para trás as luvas e o chapelinho. Mas ela levara tão a sério as opções que fez, que nada disso se via. E eu tinha apenas intuições, palpites, a gente aprende a vida a comparar o que vê. Sempre a vi livre e segura, macia e tolerante. Muito mais não sabia.
O que nela mais apreciei, e melhor usufruí, foi o homem que teve e os filhos que criou. Sei hoje que era ela o pão daquilo tudo. Da inteligência do homem, da sua argúcia lúcida, do modo como ficava, pensativo, a fazer esperas à vida, às vezes rangendo os dentes. O Ti Queirós soube sempre donde vinha o mal, que é o saber maior que pode haver.
Eu nunca cultivei invejas de ninguém, mas tive tentações disso. De ter inveja daqueles a quem tocou esta mãe. A vida foi-lhe afinal muito mais dura do que eu alguma vez imaginei. Mas nunca lhe vi nem um lamento, nem um destempero, nem uma cedência. É essa a pedra de toque da condição humana.
Jorge Carvalheira
quinta-feira, 30 de julho de 2009
Album (2)
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Cenas de um casamento
O casamento da Tia Alice realizou-se em 5 de julho de 1952, um sábado. Foi por procuração, o tio Luís, o noivo, estava em Moçambique.
Não aparecem sombras na fotografia, deveria estar o céu encoberto. O resultado foi magnifico. A forma de vestir, o indispensavel xaile num dia de verão, o chapéu de feltro dos homens,ilustram bem a mudança dos tempos.
Nesta foto aparece a minha mãe, a madrinha, em quem a noiva carinhosamente se parece apoiar. Aida aparece aqui com 40 anos, na sua plenitude.
Neste friso maravilhoso está uma boa parte do mundo da minha infância. Lá estão, entre outros, a avó Cândida, a ti Elvira, a prima Virginia, a prima Sara Carpinteira, a Madrinha Lucília, o ti António Queirós, o Amilcar e a Sãozinha que deveria levar as alianças. Joaquim Forte, irmão de Alice, que representou o noivo na cerimónia, coloca-se discretamente um pouco de lado, como que a deixar um espaço em aberto para o noivo ausente.
Luís
Cenas de um casamento
O casamento da Tia Alice realizou-se em 5 de julho de 1952, um sábado. Foi por procuração, o tio Luís, o noivo, estava em Moçambique.
Não aparecem sombras na fotografia, deveria estar o céu encoberto. O resultado foi magnifico. A forma de vestir, o indispensavel xaile num dia de verão, o chapéu de feltro dos homens,ilustram bem a mudança dos tempos.
Nesta foto aparece a minha mãe, a madrinha, em quem a noiva carinhosamente se parece apoiar. Aida aparece aqui com 40 anos, na sua plenitude.
Neste friso maravilhoso está uma boa parte do mundo da minha infância. Lá estão, entre outros, a avó Cândida, a ti Elvira, a prima Virginia, a prima Sara Carpinteira, a Madrinha Lucília, o ti António Queirós, o Amilcar e a Sãozinha que deveria levar as alianças. Joaquim Forte, irmão de Alice, que representou o noivo na cerimónia, coloca-se discretamente um pouco de lado, como que a deixar um espaço em aberto para o noivo ausente.
Luís
Lucília e Norberto
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No friso das minhas recordações de infância destacam-se as figuras saudosas do Padrinho e da Madrinha.
Mãe há só uma, eu sei, mas eu tive o privilégio de ter tido duas. Muito do que eu sou devo-o a este facto. E não esqueço a dócil figura do padrinho Norberto, que evoco com emoção. Eles foram, à sua maneira, também o meu pai e a minha mãe.
Lucília foi a única sobrevivente de uma prole de treze filhos de Faustina Barqueira e de Manuel Sardinha. Um irmão, emigrado para o Brasil, deixou de contar desde muito cedo.
Como consequência de uma amizade entre Manuel Sardinha e António Borges, ambos da Guarda Fiscal, Aida e Lucília logo desde crianças se tornaram muito próximas, amigas intimas, confidentes, relação que se manteve e aprofundou pela vida fora até que a morte as separou.
Lucília não teve filhos e adoptou de alma e coração os filhos de Aida que sempre tratou e considerou como se seus filhos fossem.
Na quarta classe, com os meus pais já na Guarda, passei um ano inteiro com ela. Ainda hoje recordo os pequenos-almoços: batatas fritas embrulhadas em ovo.
Foi nos livros do seu pai, o tio Manuel Sardinha, que eu iniciei a minha aprendizagem cultural: “A Execução dos Távoras ”, “a Filha do Polaco”, romance histórico de Campos Júnior, “Mário”, de Silva Gaio que começava assim : “ Conheceis a Beira Alta?”
E foi numa obra monumental, em fascículos, de F. Arago, C. Flammarion e A. Arcimis,“Os Astros e a Terra” que eu me iniciei nos segredos da astronomia, paixão que nunca me abandonou. A casa da madrinha com o seu sobrado, e o lagar com as ferramentas do padrinho, eram espaços de prazer e de descoberta.
Norberto Clemente, meu padrinho, era um homem bom por natureza, julgo que nunca conheci ninguém melhor do que ele. Eu acompanhava-o nas lides do campo a “Vale de Lagar”, às “Macieiras” à “Baldade”, montado, por vezes, no burro; havia entre nós uma relação muito próxima. Ele cultivava a vinha e fazia o vinho com prazer, era a sua paixão; bebia-o com moderação, sempre em casa, nunca frequentava a taberna. Com frequência íamos buscar o pão a Alameda, sempre pelo caminho de Nave Rodrigo. Conheci com ele o Ti Paco , o Lorenzo, a Cármen que tratavam o padrinho por “Sr. Alberto”. E eu já conhecia bem o recado: "Se te oferecerem alguma coisa, aceita logo, os espanhóis não oferecem segunda vez." Entre os meus três e os nove anos, com o meu pai biológico ausente em África, o padrinho foi o meu pai afectivo.
Aos afilhados deixaram os seus bens em testamento; hoje, este afilhado sente-se na obrigação de procurar outros afilhados para saldar uma gratidão infinita.
Luis
No friso das minhas recordações de infância destacam-se as figuras saudosas do Padrinho e da Madrinha.
Mãe há só uma, eu sei, mas eu tive o privilégio de ter tido duas. Muito do que eu sou devo-o a este facto. E não esqueço a dócil figura do padrinho Norberto, que evoco com emoção. Eles foram, à sua maneira, também o meu pai e a minha mãe.
Lucília foi a única sobrevivente de uma prole de treze filhos de Faustina Barqueira e de Manuel Sardinha. Um irmão, emigrado para o Brasil, deixou de contar desde muito cedo.
Como consequência de uma amizade entre Manuel Sardinha e António Borges, ambos da Guarda Fiscal, Aida e Lucília logo desde crianças se tornaram muito próximas, amigas intimas, confidentes, relação que se manteve e aprofundou pela vida fora até que a morte as separou.
Lucília não teve filhos e adoptou de alma e coração os filhos de Aida que sempre tratou e considerou como se seus filhos fossem.
Na quarta classe, com os meus pais já na Guarda, passei um ano inteiro com ela. Ainda hoje recordo os pequenos-almoços: batatas fritas embrulhadas em ovo.
Foi nos livros do seu pai, o tio Manuel Sardinha, que eu iniciei a minha aprendizagem cultural: “A Execução dos Távoras ”, “a Filha do Polaco”, romance histórico de Campos Júnior, “Mário”, de Silva Gaio que começava assim : “ Conheceis a Beira Alta?”
E foi numa obra monumental, em fascículos, de F. Arago, C. Flammarion e A. Arcimis,“Os Astros e a Terra” que eu me iniciei nos segredos da astronomia, paixão que nunca me abandonou. A casa da madrinha com o seu sobrado, e o lagar com as ferramentas do padrinho, eram espaços de prazer e de descoberta.
Norberto Clemente, meu padrinho, era um homem bom por natureza, julgo que nunca conheci ninguém melhor do que ele. Eu acompanhava-o nas lides do campo a “Vale de Lagar”, às “Macieiras” à “Baldade”, montado, por vezes, no burro; havia entre nós uma relação muito próxima. Ele cultivava a vinha e fazia o vinho com prazer, era a sua paixão; bebia-o com moderação, sempre em casa, nunca frequentava a taberna. Com frequência íamos buscar o pão a Alameda, sempre pelo caminho de Nave Rodrigo. Conheci com ele o Ti Paco , o Lorenzo, a Cármen que tratavam o padrinho por “Sr. Alberto”. E eu já conhecia bem o recado: "Se te oferecerem alguma coisa, aceita logo, os espanhóis não oferecem segunda vez." Entre os meus três e os nove anos, com o meu pai biológico ausente em África, o padrinho foi o meu pai afectivo.
Aos afilhados deixaram os seus bens em testamento; hoje, este afilhado sente-se na obrigação de procurar outros afilhados para saldar uma gratidão infinita.
Luis
Album (1)
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Uma flor na mão...
Esta foto é conhecida na família
Em 2002, a prima Helena Campos Teixeira enviou-me esta que aqui apresento, com a seguinte dedicatória:
Primo Luís,
Tomei a liberdade de te enviar esta foto que mandei reproduzir para ti. Acredito que vá mexer com os teus sentimentos assim como acontece comigo que sou uma sentimental e sensível.
Aqui está a nossa primeira família: Bisavó Reta, Mamã Laura, Tia Aida, Pai Toneca.
Falta o tio Zeca e um gémeo dele que ainda não tinham nascido. E o nosso avô estava em África. A mamã Laura, naquele tempo, fez 14 viagens a África.
Tua prima
Maria Helena
Notas
Curiosa esta referência ao irmão gémeo do tio Zeca,nunca a tinha ouvido antes. O tratamento da avó Laura por Mamã era já conhecido. Era assim que minha mãe a tratava quando falava dela para os irmãos. Para nós, os filhos, foi sempre a avó Laura.
Presumo que esta fotografia foi tirada em 1915. Sebastião estaria na Guiné. Existe um postal (na posse do António) que Aida envia para o pai (escrito pelo punho de Laura) que atesta isso mesmo.
Luís
Uma flor na mão...
Esta foto é conhecida na família
Em 2002, a prima Helena Campos Teixeira enviou-me esta que aqui apresento, com a seguinte dedicatória:
Primo Luís,
Tomei a liberdade de te enviar esta foto que mandei reproduzir para ti. Acredito que vá mexer com os teus sentimentos assim como acontece comigo que sou uma sentimental e sensível.
Aqui está a nossa primeira família: Bisavó Reta, Mamã Laura, Tia Aida, Pai Toneca.
Falta o tio Zeca e um gémeo dele que ainda não tinham nascido. E o nosso avô estava em África. A mamã Laura, naquele tempo, fez 14 viagens a África.
Tua prima
Maria Helena
Notas
Curiosa esta referência ao irmão gémeo do tio Zeca,nunca a tinha ouvido antes. O tratamento da avó Laura por Mamã era já conhecido. Era assim que minha mãe a tratava quando falava dela para os irmãos. Para nós, os filhos, foi sempre a avó Laura.
Presumo que esta fotografia foi tirada em 1915. Sebastião estaria na Guiné. Existe um postal (na posse do António) que Aida envia para o pai (escrito pelo punho de Laura) que atesta isso mesmo.
Luís
quarta-feira, 29 de julho de 2009
A atracção pelos poços (2)
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Coitadinho, afogou-se
Não fosse o apurado ouvido da minha mãe e eu teria, por certo, virado anjinho quando tinha para aí uns 3 anos de idade.
Era uma daquelas tardes em que os afazeres do campo deixavam a aldeia quase deserta e as ondas do som se propagam mais facilmente.
A minha mãe costurava nos degraus da casa da varanda, talvez cosendo os fundilhos de umas calças, desgastados no escorrega da lancha do forte, enquanto eu e o Norberto nos entretínhamos junto do poço da casa da avó Cândida.
Reinava aquele silêncio quando, a certa altura, ouviu o Norberto balbuciar: Coitadinho afogou-se.
Como não havia mais ninguém, o coitadinho, o afogado, só podia ser eu.
Aos gritos de pedido de socorro, enquanto corria para o local, acudiu o ti Alberto Carriço que trabalhava próximo e terá chegado a tempo de me tirar do poço
Quis o destino que, passados uns anos, fosse o Norberto a cair naquele mesmo poço. E, numa família que nunca acreditou muito nestas coisas, voltou a dar-se o milagre: salvou-se.
Armando
Coitadinho, afogou-se
Não fosse o apurado ouvido da minha mãe e eu teria, por certo, virado anjinho quando tinha para aí uns 3 anos de idade.
Era uma daquelas tardes em que os afazeres do campo deixavam a aldeia quase deserta e as ondas do som se propagam mais facilmente.
A minha mãe costurava nos degraus da casa da varanda, talvez cosendo os fundilhos de umas calças, desgastados no escorrega da lancha do forte, enquanto eu e o Norberto nos entretínhamos junto do poço da casa da avó Cândida.
Reinava aquele silêncio quando, a certa altura, ouviu o Norberto balbuciar: Coitadinho afogou-se.
Como não havia mais ninguém, o coitadinho, o afogado, só podia ser eu.
Aos gritos de pedido de socorro, enquanto corria para o local, acudiu o ti Alberto Carriço que trabalhava próximo e terá chegado a tempo de me tirar do poço
Quis o destino que, passados uns anos, fosse o Norberto a cair naquele mesmo poço. E, numa família que nunca acreditou muito nestas coisas, voltou a dar-se o milagre: salvou-se.
Armando
terça-feira, 28 de julho de 2009
Aida e José
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Aida e José casaram em 16 de Março de 1938. Foi numa quarta-feira dia de lua cheia, terá sido esta a data do enlace civil em Almeida. Não existem referências ao casamento religioso que se terá realizado em S. Pedro, não existem fotos, não se sabe quem foram os padrinhos, não se sabe se terá havido boda. Quase certo é que a família de Aida, a mãe Laura e o padrasto António Borges que ela tratava por Papá, não terão ido ao casamento. Possivelmente nem os irmãos, presumo que talvez Zeca, com pouco mais de 20 anos terá estado presente.
O primeiro filho, António, nasceria três meses depois e isso explica a precipitação do casamento. O namoro e o casamento não estavam certamente nos planos de Laura e António que fortemente o contrariaram; aliás colheu de surpresa toda a Aldeia que viu nele a dissonância de um enlace entre opostos: a menina prendada, educada, culta, preparada para outros destinos e o homem rude de mãos calejadas pelo trabalho no campo, dedos adaptados à foice, pele tisnada pelo sol. Numa primeira reacção, até Cândida, mãe de José, terá questionado a falta de qualidades da futura nora, que não sabia plantar uma couve, mondar uma seara, ordenhar uma cabra. Cedo perceberia, porém, a qualidade do material de que ela era feita.
Eu imagino que a vida de Aida, com 25 anos, estava a chegar a um ponto de ruptura. Alguma paixão adolescente, já lhe teria ensinado a avaliar pessoas, personalidades, traços de carácter, a ler na alma, o que às vezes os olhos escondem, a distinguir entre o superficial e o profundo…
Nesta crucial decisão da sua vida, ao aceitar José como esposo, Aida viu mais longe. Terá visto nele o homem profundamente humano, visceralmente honesto, trabalhador incansável, inteligente e justo. E isto, sei-o eu, não era perceptível para toda a gente. Era o perfil enigmático dos “Queiroses”, filósofos, ensimesmados, pensadores, inadaptados, sempre com os atacadores dos sapatos desapertados…
Aida e José, foram amigos e felizes. Nunca testemunhei uma ofensa, uma falta de respeito, o mínimo gesto de violência, física ou verbal entre eles.
Luís
Aida e José casaram em 16 de Março de 1938. Foi numa quarta-feira dia de lua cheia, terá sido esta a data do enlace civil em Almeida. Não existem referências ao casamento religioso que se terá realizado em S. Pedro, não existem fotos, não se sabe quem foram os padrinhos, não se sabe se terá havido boda. Quase certo é que a família de Aida, a mãe Laura e o padrasto António Borges que ela tratava por Papá, não terão ido ao casamento. Possivelmente nem os irmãos, presumo que talvez Zeca, com pouco mais de 20 anos terá estado presente.
O primeiro filho, António, nasceria três meses depois e isso explica a precipitação do casamento. O namoro e o casamento não estavam certamente nos planos de Laura e António que fortemente o contrariaram; aliás colheu de surpresa toda a Aldeia que viu nele a dissonância de um enlace entre opostos: a menina prendada, educada, culta, preparada para outros destinos e o homem rude de mãos calejadas pelo trabalho no campo, dedos adaptados à foice, pele tisnada pelo sol. Numa primeira reacção, até Cândida, mãe de José, terá questionado a falta de qualidades da futura nora, que não sabia plantar uma couve, mondar uma seara, ordenhar uma cabra. Cedo perceberia, porém, a qualidade do material de que ela era feita.
Eu imagino que a vida de Aida, com 25 anos, estava a chegar a um ponto de ruptura. Alguma paixão adolescente, já lhe teria ensinado a avaliar pessoas, personalidades, traços de carácter, a ler na alma, o que às vezes os olhos escondem, a distinguir entre o superficial e o profundo…
Nesta crucial decisão da sua vida, ao aceitar José como esposo, Aida viu mais longe. Terá visto nele o homem profundamente humano, visceralmente honesto, trabalhador incansável, inteligente e justo. E isto, sei-o eu, não era perceptível para toda a gente. Era o perfil enigmático dos “Queiroses”, filósofos, ensimesmados, pensadores, inadaptados, sempre com os atacadores dos sapatos desapertados…
Aida e José, foram amigos e felizes. Nunca testemunhei uma ofensa, uma falta de respeito, o mínimo gesto de violência, física ou verbal entre eles.
Luís
segunda-feira, 27 de julho de 2009
Um coração de Pedra
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Ainda pequenos, vimos partir o nosso pai para terras longínquas à procura, para uma família já crescida , do sustento que ali se tornava cada vez mais difícil conseguir.
Estas partidas, para outros continentes, revestiam-se, na altura, de um certo dramatismo. Basta lembrar que se passavam muitos dias até à chegada de uma primeira carta com noticias .
Eu tinha seis anos, e recordo que toda a gente chorava quando o meu pai foi para Angola. Como fui o único a não chorar tive que aguentar o comentários das velhas : “este tem um coração de pedra” .
E àquela casa vimos regressar, passados seis anos, um Zé Queirós combalido por uma doença tropical e que na estação de Vilar Formoso, onde o esperávamos, foi dizendo, logo que desceu do comboio, o nome de cada um de nós, como que a confirmar: “estão a ver que ainda vos conheço”.
Armando
Ainda pequenos, vimos partir o nosso pai para terras longínquas à procura, para uma família já crescida , do sustento que ali se tornava cada vez mais difícil conseguir.
Estas partidas, para outros continentes, revestiam-se, na altura, de um certo dramatismo. Basta lembrar que se passavam muitos dias até à chegada de uma primeira carta com noticias .
Eu tinha seis anos, e recordo que toda a gente chorava quando o meu pai foi para Angola. Como fui o único a não chorar tive que aguentar o comentários das velhas : “este tem um coração de pedra” .
E àquela casa vimos regressar, passados seis anos, um Zé Queirós combalido por uma doença tropical e que na estação de Vilar Formoso, onde o esperávamos, foi dizendo, logo que desceu do comboio, o nome de cada um de nós, como que a confirmar: “estão a ver que ainda vos conheço”.
Armando
Laureano, o tio desaparecido
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João Moutinho e Maria Reta tiveram três filhos: Porfírio, Laureano e Laura. Terá havido ainda outro filho de nome Abraão que terá morrido na infância. Por volta de 1905, como já se viu, Laureano embarca em Cádiz rumo à Argentina para nunca mais voltar. Nesses anos do inicio do século XX, muitos de S. Pedro emigravam para a Argentina pelo caminho espanhol, arregimentados, junto com grupos de espanhóis, todos indocumentados. Na minha infância, as referências que ouvia da minha mãe ao tio Laureano eram escassas e vagas: que lhe terá acontecido?, será vivo?, terá filhos?.
Numa ocasião, através de um regressado, recebemos um relato na terceira pessoa, que falava de um tal Dom Laureano, senhor de terras nas Pampas que andava de “charrete” e usava longas barbas. Logo a imaginação infantil se incendiou e idealizou um mundo de cavalos, de ranchos, de cowboys e de aventuras.
Mas a verdadeira história de Laureano conheci-a eu muitos anos depois quando um seu neto, Juan Carlos Augusto, anuncia na Internet “ busco alguién de S. Pedro do Rio Seco que me informe sobre mi abuelo Laureano, hijo de Juan Moutinho y Maria Reta”
Quando o pedido cai por acaso no meu computador as campainhas soaram logo: será possível, será o mesmo Laureano?
Era.
Laureano casou em Puan, província de Buenos Aires, com Maria Schneider de dezasseis anos, nascida em Bahia Blanca, filha de uns alemães que já tinham andado pela Rússia, onde não terão prosperado e que ficariam conhecidos na Argentina por “alemães do Volga”.
Laureano e Maria tiveram 24, digo bem, vinte e quatro filhos. Netos não sei , terão sido muitos,todos meus primos. Maria chegou mesmo a ser agraciada, no dia da mãe, pelo intendente de Alpachiri - terra onde ficou a viver - pela sua contribuição para o aumento populacional.
A um dos filhos Laureano pôs o nome de Porfírio, uma filha baptizou-a de Laura. Laureano nunca terá esquecido S. Pedro e a sua infância. Mas nunca chegou a saber que tinha uma sobrinha chamada Aida.
Luís
João Moutinho e Maria Reta tiveram três filhos: Porfírio, Laureano e Laura. Terá havido ainda outro filho de nome Abraão que terá morrido na infância. Por volta de 1905, como já se viu, Laureano embarca em Cádiz rumo à Argentina para nunca mais voltar. Nesses anos do inicio do século XX, muitos de S. Pedro emigravam para a Argentina pelo caminho espanhol, arregimentados, junto com grupos de espanhóis, todos indocumentados. Na minha infância, as referências que ouvia da minha mãe ao tio Laureano eram escassas e vagas: que lhe terá acontecido?, será vivo?, terá filhos?.
Numa ocasião, através de um regressado, recebemos um relato na terceira pessoa, que falava de um tal Dom Laureano, senhor de terras nas Pampas que andava de “charrete” e usava longas barbas. Logo a imaginação infantil se incendiou e idealizou um mundo de cavalos, de ranchos, de cowboys e de aventuras.
Mas a verdadeira história de Laureano conheci-a eu muitos anos depois quando um seu neto, Juan Carlos Augusto, anuncia na Internet “ busco alguién de S. Pedro do Rio Seco que me informe sobre mi abuelo Laureano, hijo de Juan Moutinho y Maria Reta”
Quando o pedido cai por acaso no meu computador as campainhas soaram logo: será possível, será o mesmo Laureano?
Era.
Laureano casou em Puan, província de Buenos Aires, com Maria Schneider de dezasseis anos, nascida em Bahia Blanca, filha de uns alemães que já tinham andado pela Rússia, onde não terão prosperado e que ficariam conhecidos na Argentina por “alemães do Volga”.
Laureano e Maria tiveram 24, digo bem, vinte e quatro filhos. Netos não sei , terão sido muitos,todos meus primos. Maria chegou mesmo a ser agraciada, no dia da mãe, pelo intendente de Alpachiri - terra onde ficou a viver - pela sua contribuição para o aumento populacional.
A um dos filhos Laureano pôs o nome de Porfírio, uma filha baptizou-a de Laura. Laureano nunca terá esquecido S. Pedro e a sua infância. Mas nunca chegou a saber que tinha uma sobrinha chamada Aida.
Luís
sexta-feira, 24 de julho de 2009
O bisneto mais novo
Eu sou o bisneto mais novo da minha bisavó Aida e sou filho da sua primeira neta.
Como sou parecido com a minha mãe e ela é parecida com a sua avó Aida, até um adulto concluiria que sou parecido com a minha bisavó .
Tenho dois primos que também são bisnetos da minha bisavó, mas esses não são do Benfica. Pode ser que ainda melhorem.
Hoje faço 2 anos, mas quando me perguntam quantos anos faço, respondo: Tês !
Chamo-me Daniel, mas digo: Niel !
Ainda não sei dizer Bisavó, mas como já sei dizer Avó, é só acrescentar mais uma sílaba.
Quando digo qualquer coisa e o meu avô não entende, diz-me que pareço o Tchililomau. Não sei bem o que isso quer dizer, mas também não lhe pergunto, deve ser coisa de velhos.
Este ano estou a pensar ir pela primeira vez à terra do meu avô Armando, mas vou portar-me bem. Não vou fazer como ele, quando era pequeno, atirar pedras aos gatos e aos cães, ir aos ninhos e andar a correr atrás dos carros.
Não sei se encontrarei lá parceiros à minha altura para jogar ao rilha, à tchona e ao beti. À manta é que não vou jogar, porque isso é jogo de raparigas.
Também não vou andar à bulha com os outros garotos, só porque alguém me diz: Este aqui disse que não tem medo de ti.
Se alguém me convidar para ir às saboquecas, terei que arranjar quem me ajude a carregá-las porque ainda não tenho assim tanta força.
O que não vou deixar é de dar uma escorregadela na Lancha do Forte. E não preciso que os velhos me indiquem o sítio, porque ainda lá estão as marcas que eles deixaram.
Daniel
Como sou parecido com a minha mãe e ela é parecida com a sua avó Aida, até um adulto concluiria que sou parecido com a minha bisavó .
Tenho dois primos que também são bisnetos da minha bisavó, mas esses não são do Benfica. Pode ser que ainda melhorem.
Hoje faço 2 anos, mas quando me perguntam quantos anos faço, respondo: Tês !
Chamo-me Daniel, mas digo: Niel !
Ainda não sei dizer Bisavó, mas como já sei dizer Avó, é só acrescentar mais uma sílaba.
Quando digo qualquer coisa e o meu avô não entende, diz-me que pareço o Tchililomau. Não sei bem o que isso quer dizer, mas também não lhe pergunto, deve ser coisa de velhos.
Este ano estou a pensar ir pela primeira vez à terra do meu avô Armando, mas vou portar-me bem. Não vou fazer como ele, quando era pequeno, atirar pedras aos gatos e aos cães, ir aos ninhos e andar a correr atrás dos carros.
Não sei se encontrarei lá parceiros à minha altura para jogar ao rilha, à tchona e ao beti. À manta é que não vou jogar, porque isso é jogo de raparigas.
Também não vou andar à bulha com os outros garotos, só porque alguém me diz: Este aqui disse que não tem medo de ti.
Se alguém me convidar para ir às saboquecas, terei que arranjar quem me ajude a carregá-las porque ainda não tenho assim tanta força.
O que não vou deixar é de dar uma escorregadela na Lancha do Forte. E não preciso que os velhos me indiquem o sítio, porque ainda lá estão as marcas que eles deixaram.
Daniel
A atracção pelos poços (1)
.
O Norberto é chamado a depor
Passados tantos anos, não me é fácil transpor para o papel as recordações da minha MÃE, uma MÃE com um coração dócil, afável e bondoso. A minha memória recua aos tempos em que ela sozinha, por ausência do meu pai, em África, onde fora ganhar o sustento para a família, educava quatro filhos, crianças a caminho da adolescência, talvez nas idades mais difíceis de educar.
Das muitas recordações que me deixou posso relatar algumas que mostram um pouco aquilo que ela era.
Éramos ainda pequenos quando eu e o meu irmão Armando fomos aos figos para o curral da avó Cândida Queiroz e eu caí da figueira para o poço, que ainda hoje lá está.
Não me afoguei porque o poço tinha pouca água, mas fiquei no fundo desmaiado. O meu irmão correu a chamar a minha MÃE que estava a lavar roupa num tanque do ti António Gomes, ali para os lados do Calvário.
Quando chegou, aflita, já alguém me tinha tirado do poço e tomado a iniciativa de mandar chamar o Dr. Casimiro, médico de Almeida; o mensageiro fez o favor de se deslocar de bicicleta que era o meio de comunicação mais rápido que existia lá na terra naquela altura.
Uns anos antes tinha sido o Armando a cair naquele mesmo poço, quando brincava comigo, e eu gritei “ai, coitadinho afogou-se”.
Também, noutra ocasião, o meu irmão António me salvou de morrer afogado no horto do “Malavado” quando caí para o poço dos Morgados, após termos sachado ou mondado as batatas. Ainda tentámos secar a roupa para esconder à nossa MÃE o que tinha acontecido mas sem sucesso; devido á sua astúcia não demorou a descobrir o acontecido.
Terei eu este destino de cair aos poços?
Quando alguns de nós fazia algo de mal como aparecer em casa com os calções rotos de escorregar na Lancha do Forte o castigo que ela nos dava era atar-nos com uma linha de coser a uma perna da mesa da sala. Durante algum tempo ali ficávamos, sempre quietinhos, obedientes, resignados.
Foi esposa dedicada e colaborante de barbeiro, carniceiro, taberneiro actividades que sempre desempenhou com coragem e abnegação.
Foi na actividade comercial na Guarda onde mais se notabilizou: fazia tudo: era cozinheira, taberneira arrumadora de quartos etc. Dotada de uma psicologia muito especial, não era necessário muito tempo para saber como lidar com o próximo de forma sempre respeitadora e respeitada. Por alguns era tratada por D. Aida por outros por Senhora Aida e ainda havia uma minoria, os que tinham mais confiança e amizade para quem era a Ti Aida.
Durante várias décadas a nossa família ficou e ficará com história na Guarda devido muito á bondade de minha MÃE. Estava sempre de coração aberto para quem quer que fosse: lembro-me que clientes como Srs. Pinho, Mineiro, Bidarra da Soc. Transportes, “maleiros” e tantos outros quando iam “matar o bicho” não podiam passar sem ir à cozinha ver a minha MÃE já com intenção de provarem um petisco da ementa do dia, ela já os conhecia muito bem.
Foi pena o destino tê-la levado tão cedo. Imagino muitas vezes como teria sido como sogra, - das noras apenas conheceu a minha mulher Emília -, e como avó, quanto ela teria gostado de ver os netos!
Haveria imensas coisas boas para relatar. As suas memórias dariam um belíssimo romance, a sua vida um exemplo a seguir.
Norberto
O Norberto é chamado a depor
Passados tantos anos, não me é fácil transpor para o papel as recordações da minha MÃE, uma MÃE com um coração dócil, afável e bondoso. A minha memória recua aos tempos em que ela sozinha, por ausência do meu pai, em África, onde fora ganhar o sustento para a família, educava quatro filhos, crianças a caminho da adolescência, talvez nas idades mais difíceis de educar.
Das muitas recordações que me deixou posso relatar algumas que mostram um pouco aquilo que ela era.
Éramos ainda pequenos quando eu e o meu irmão Armando fomos aos figos para o curral da avó Cândida Queiroz e eu caí da figueira para o poço, que ainda hoje lá está.
Não me afoguei porque o poço tinha pouca água, mas fiquei no fundo desmaiado. O meu irmão correu a chamar a minha MÃE que estava a lavar roupa num tanque do ti António Gomes, ali para os lados do Calvário.
Quando chegou, aflita, já alguém me tinha tirado do poço e tomado a iniciativa de mandar chamar o Dr. Casimiro, médico de Almeida; o mensageiro fez o favor de se deslocar de bicicleta que era o meio de comunicação mais rápido que existia lá na terra naquela altura.
Uns anos antes tinha sido o Armando a cair naquele mesmo poço, quando brincava comigo, e eu gritei “ai, coitadinho afogou-se”.
Também, noutra ocasião, o meu irmão António me salvou de morrer afogado no horto do “Malavado” quando caí para o poço dos Morgados, após termos sachado ou mondado as batatas. Ainda tentámos secar a roupa para esconder à nossa MÃE o que tinha acontecido mas sem sucesso; devido á sua astúcia não demorou a descobrir o acontecido.
Terei eu este destino de cair aos poços?
Quando alguns de nós fazia algo de mal como aparecer em casa com os calções rotos de escorregar na Lancha do Forte o castigo que ela nos dava era atar-nos com uma linha de coser a uma perna da mesa da sala. Durante algum tempo ali ficávamos, sempre quietinhos, obedientes, resignados.
Foi esposa dedicada e colaborante de barbeiro, carniceiro, taberneiro actividades que sempre desempenhou com coragem e abnegação.
Foi na actividade comercial na Guarda onde mais se notabilizou: fazia tudo: era cozinheira, taberneira arrumadora de quartos etc. Dotada de uma psicologia muito especial, não era necessário muito tempo para saber como lidar com o próximo de forma sempre respeitadora e respeitada. Por alguns era tratada por D. Aida por outros por Senhora Aida e ainda havia uma minoria, os que tinham mais confiança e amizade para quem era a Ti Aida.
Durante várias décadas a nossa família ficou e ficará com história na Guarda devido muito á bondade de minha MÃE. Estava sempre de coração aberto para quem quer que fosse: lembro-me que clientes como Srs. Pinho, Mineiro, Bidarra da Soc. Transportes, “maleiros” e tantos outros quando iam “matar o bicho” não podiam passar sem ir à cozinha ver a minha MÃE já com intenção de provarem um petisco da ementa do dia, ela já os conhecia muito bem.
Foi pena o destino tê-la levado tão cedo. Imagino muitas vezes como teria sido como sogra, - das noras apenas conheceu a minha mulher Emília -, e como avó, quanto ela teria gostado de ver os netos!
Haveria imensas coisas boas para relatar. As suas memórias dariam um belíssimo romance, a sua vida um exemplo a seguir.
Norberto
quinta-feira, 23 de julho de 2009
A Casa da Varanda (2)
.
A Casa da Varanda não foi apenas a casa onde nascemos e vivemos os primeiros anos das nossas vidas. Foi no período em que vivemos naquela casa, mais do que em qualquer outro, que adquirimos as características mais marcantes que, positiva ou negativamente, ainda hoje nos distinguem .
Da parte Queirós herdámos a teimosia, o desleixo, a seriedade e alguma capacidade de raciocínio.
Com a nossa mãe fomo-nos habituando a conviver com alguma subtileza e com alguns preceitos de civilidade, não muito usuais no meio em vivíamos.
Mas o respeito com que hoje somos tratados quando nos apresentamos como filhos do ti Zé Queirós e da ti Aida, será, porventura, o maior legado que deles recebemos É como se tivesse transitado para nós o respeito com que, em regra, foram sempre tratados, não obstante a modéstia dos lugares que ocuparam na sociedade.
Tanto o nosso pai como a nossa mãe procuraram sempre cultivar aquela regra: “Dá-te ao respeito se queres ser respeitado” .E disso ficou-nos qualquer coisa.
Hoje, é com uma certa vaidade que qualquer um de nós se identifica, na Guarda ou em S. Pedro, como filho do ti Zé Queirós e da ti Aida.
Armando
A Casa da Varanda não foi apenas a casa onde nascemos e vivemos os primeiros anos das nossas vidas. Foi no período em que vivemos naquela casa, mais do que em qualquer outro, que adquirimos as características mais marcantes que, positiva ou negativamente, ainda hoje nos distinguem .
Da parte Queirós herdámos a teimosia, o desleixo, a seriedade e alguma capacidade de raciocínio.
Com a nossa mãe fomo-nos habituando a conviver com alguma subtileza e com alguns preceitos de civilidade, não muito usuais no meio em vivíamos.
Mas o respeito com que hoje somos tratados quando nos apresentamos como filhos do ti Zé Queirós e da ti Aida, será, porventura, o maior legado que deles recebemos É como se tivesse transitado para nós o respeito com que, em regra, foram sempre tratados, não obstante a modéstia dos lugares que ocuparam na sociedade.
Tanto o nosso pai como a nossa mãe procuraram sempre cultivar aquela regra: “Dá-te ao respeito se queres ser respeitado” .E disso ficou-nos qualquer coisa.
Hoje, é com uma certa vaidade que qualquer um de nós se identifica, na Guarda ou em S. Pedro, como filho do ti Zé Queirós e da ti Aida.
Armando
A primeira neta da Avó Aida
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Nem eu, nem nenhum dos meus 7 primos do lado paterno, tivemos a oportunidade de conhecer a Avó Aida.
Tudo o que conheço da minha Avó Aida é através do meu pai (por vezes, por insistência minha) ou, ocasionalmente, em reuniões familiares, onde por vezes não há unanimidade acerca de datas ou outros factos ocorridos há muitos anos.
Fiquei contente por se ter criado este blog, é assim uma oportunidade de conhecer melhor a minha Avó paterna.
E já que há quem considere que tenho algumas semelhanças com a Avó Aida, gostava de ver publicado fotografias suas quando tinha a minha idade. Será que existem?
Patrícia
Nem eu, nem nenhum dos meus 7 primos do lado paterno, tivemos a oportunidade de conhecer a Avó Aida.
Tudo o que conheço da minha Avó Aida é através do meu pai (por vezes, por insistência minha) ou, ocasionalmente, em reuniões familiares, onde por vezes não há unanimidade acerca de datas ou outros factos ocorridos há muitos anos.
Fiquei contente por se ter criado este blog, é assim uma oportunidade de conhecer melhor a minha Avó paterna.
E já que há quem considere que tenho algumas semelhanças com a Avó Aida, gostava de ver publicado fotografias suas quando tinha a minha idade. Será que existem?
Patrícia
quarta-feira, 22 de julho de 2009
Os bons malandros do Liceu
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Na Guarda dos anos sessenta , um grupo de amigos e colegas do Liceu, o Veiga, o Carvalheira, o Rodrigues , o Jacinto e outros, frequentavam a casa da Ti Aida e do Ti Zé Queirós. Por todos eles, havia um carinho especial e para eles sempre uma palavra amiga que ainda hoje recordam. Fala o Jacinto:
Guarda, 1962/1963
A minha estada na Guarda foi só no ano lectivo de 1962/1963, pelo que não tive oportunidade de conhecer muito bem a D. Aida Teixeira. No entanto tendo eu tido o privilégio de ser “apadrinhado” por um grupo de malandros a que pertencia o Luís Queirós, ainda contactei algumas vezes com a sua mãe.
Dos contactos que tive com a D. Aida ficou-me a ideia de ser uma pessoa boa e recta. Estava sempre pronta a ouvir, ajudar e dar um conselho. E embora não tenha acontecido comigo, sei que em face de situações um pouco mais brejeiras, que por vezes se soltavam da rapaziada ( coisas de garotos! ), à D. Aida subia-lhe a mostarda ao nariz, como se costuma dizer, e a ordem era estabelecida, ou pelo menos as leis para tal eram decretadas.. e ponto final.
As pessoas boas deixam sempre saudades. A D. Aida deixou mais porque morreu cedo. Deus, o destino, seja o que for, assim o determinou, e o nosso desejo é que tenha sido para descansar em paz, pois penso que cumpriu inteiramente a sua missão neste mundo, com continuidade da sua presença através das crias que deixou.
Jacinto
Na Guarda dos anos sessenta , um grupo de amigos e colegas do Liceu, o Veiga, o Carvalheira, o Rodrigues , o Jacinto e outros, frequentavam a casa da Ti Aida e do Ti Zé Queirós. Por todos eles, havia um carinho especial e para eles sempre uma palavra amiga que ainda hoje recordam. Fala o Jacinto:
Guarda, 1962/1963
A minha estada na Guarda foi só no ano lectivo de 1962/1963, pelo que não tive oportunidade de conhecer muito bem a D. Aida Teixeira. No entanto tendo eu tido o privilégio de ser “apadrinhado” por um grupo de malandros a que pertencia o Luís Queirós, ainda contactei algumas vezes com a sua mãe.
Dos contactos que tive com a D. Aida ficou-me a ideia de ser uma pessoa boa e recta. Estava sempre pronta a ouvir, ajudar e dar um conselho. E embora não tenha acontecido comigo, sei que em face de situações um pouco mais brejeiras, que por vezes se soltavam da rapaziada ( coisas de garotos! ), à D. Aida subia-lhe a mostarda ao nariz, como se costuma dizer, e a ordem era estabelecida, ou pelo menos as leis para tal eram decretadas.. e ponto final.
As pessoas boas deixam sempre saudades. A D. Aida deixou mais porque morreu cedo. Deus, o destino, seja o que for, assim o determinou, e o nosso desejo é que tenha sido para descansar em paz, pois penso que cumpriu inteiramente a sua missão neste mundo, com continuidade da sua presença através das crias que deixou.
Jacinto
Aida jovem
.
Não é fácil um filho falar da sua mãe de uma forma objectiva. E mais difícil ainda se torna para um filho de S. Pedro, onde parecia mal chorar, onde os sentimentos eram reprimidos, onde amar era “tabu”, onde aos cães atirávamos pedras, aos ninhos dos pássaros roubávamos os ovos, aos burros e vacas explorávamos até à exaustão.
Pois foi a essa terra que um dia, menina e moça, foi parar a minha mãe.
Às vezes eu imagino-a muito nova na loja do meio do povo, morena com umas tranças de um cabelo muito preto e usando um vestido simples, de chita. Imagino-a com uma capinha de lã, com umas meias de lã grossa e uns sapatos rasos.
Alguém que um dia me confessou ter tido um fraquinho por ela, chamava-lhe carinhosamente “a preta” tão morena que ela era. E os seus olhos eram de um castanho-escuro quase pretos, muito vivos e brilhantes
As pessoas gostavam dela mas ela tinha medo das pessoas, odiava os palavrões e a agressividade; por isso, sentia-se melhor do lado de dentro do balcão, sentia-se mais protegida. Era o seu mundo.
Lia tudo o que apanhava à mão, livros, folhas de jornais, sonhava com países longínquos e príncipes encantados.
Sonhava … sonhava
Luís
Não é fácil um filho falar da sua mãe de uma forma objectiva. E mais difícil ainda se torna para um filho de S. Pedro, onde parecia mal chorar, onde os sentimentos eram reprimidos, onde amar era “tabu”, onde aos cães atirávamos pedras, aos ninhos dos pássaros roubávamos os ovos, aos burros e vacas explorávamos até à exaustão.
Pois foi a essa terra que um dia, menina e moça, foi parar a minha mãe.
Às vezes eu imagino-a muito nova na loja do meio do povo, morena com umas tranças de um cabelo muito preto e usando um vestido simples, de chita. Imagino-a com uma capinha de lã, com umas meias de lã grossa e uns sapatos rasos.
Alguém que um dia me confessou ter tido um fraquinho por ela, chamava-lhe carinhosamente “a preta” tão morena que ela era. E os seus olhos eram de um castanho-escuro quase pretos, muito vivos e brilhantes
As pessoas gostavam dela mas ela tinha medo das pessoas, odiava os palavrões e a agressividade; por isso, sentia-se melhor do lado de dentro do balcão, sentia-se mais protegida. Era o seu mundo.
Lia tudo o que apanhava à mão, livros, folhas de jornais, sonhava com países longínquos e príncipes encantados.
Sonhava … sonhava
Luís
terça-feira, 21 de julho de 2009
A Casa da Varanda
.
Com este "post" inicia-se a colaboração do Armando no Blog. Seguem-se outros textos que ele dedica os netos e bisnetos de Maria Aida Pinto Teixeira e de José Luis Andrade Queirós. Neles transparece a finura, a argúcia e o sentido de humor a que o Armando nos habituou. Para ler e comentar
A Casa da Varanda
Até poderia ser o nome de um solar, eventualmente transformado em Turismo Rural. Mas não é.
Casa da Varanda é apenas a casa onde nascemos e vivemos os primeiros anos das nossas vidas. No meu caso, doze anos.
Subindo os degraus de pedra, entrava-se directamente numa sala pequena que em S. Pedro é chamada “meio da casa” pronunciando-se “meidacasa” tendo, no mesmo piso, mais uma cozinha e dois pequenos quartos.
No piso inferior, a nível da rua, havia uma loja que servia para tudo.
A primeira divisão era a barbearia do ti Zé Queirós. Para além disso tinha um poleiro para as galinhas, guardavam-se as batatas, as abóboras e outras colheitas, uma salgadeira, um celeiro para os cereais de colheita e para os recebidos, como avença anual, dos fregueses a quem semanalmente o nosso pai rapava os queixos.
Uma vez até serviu para sala de jantar do casamento da nossa vizinha Rosita.
Hoje, olhamos para aquela casa com uma certa nostalgia e fomos, naturalmente, apagando da memória o desconforto que lá vivemos, até porque nunca tínhamos experimentado nada melhor.
Mas para a nossa mãe que tinha passado por situações bem mais confortáveis, não foi concerteza nada fácil ter tido e criado quatro filhos na Casa da Varanda
Armando
Com este "post" inicia-se a colaboração do Armando no Blog. Seguem-se outros textos que ele dedica os netos e bisnetos de Maria Aida Pinto Teixeira e de José Luis Andrade Queirós. Neles transparece a finura, a argúcia e o sentido de humor a que o Armando nos habituou. Para ler e comentar
A Casa da Varanda
Até poderia ser o nome de um solar, eventualmente transformado em Turismo Rural. Mas não é.
Casa da Varanda é apenas a casa onde nascemos e vivemos os primeiros anos das nossas vidas. No meu caso, doze anos.
Subindo os degraus de pedra, entrava-se directamente numa sala pequena que em S. Pedro é chamada “meio da casa” pronunciando-se “meidacasa” tendo, no mesmo piso, mais uma cozinha e dois pequenos quartos.
No piso inferior, a nível da rua, havia uma loja que servia para tudo.
A primeira divisão era a barbearia do ti Zé Queirós. Para além disso tinha um poleiro para as galinhas, guardavam-se as batatas, as abóboras e outras colheitas, uma salgadeira, um celeiro para os cereais de colheita e para os recebidos, como avença anual, dos fregueses a quem semanalmente o nosso pai rapava os queixos.
Uma vez até serviu para sala de jantar do casamento da nossa vizinha Rosita.
Hoje, olhamos para aquela casa com uma certa nostalgia e fomos, naturalmente, apagando da memória o desconforto que lá vivemos, até porque nunca tínhamos experimentado nada melhor.
Mas para a nossa mãe que tinha passado por situações bem mais confortáveis, não foi concerteza nada fácil ter tido e criado quatro filhos na Casa da Varanda
Armando
segunda-feira, 20 de julho de 2009
Tio Zeca (1)
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Do casamento de Laura com Sebastião Pinto Teixeira nasceram além de Aida mais três filhos, o mais velho chamava-se Manuel e terá nascido apenas para alimentar as estatísticas de mortalidade infantil, elevada naqueles tempos. Os outros dois, mais novos do que Aida, eram Porfirio António e José que ficariam conhecidos na família pelo tio Toneca e pelo tio Zeca
Este tio Zeca de quem se contam picarescas histórias foi um homem com uma vida recheada. Fica registada neste blog uma dessas histórias que eu próprio recolhi da sua boca. Muita da sua vida se explica pelo facto de desde muito novo ter sido deixado entregue a si próprio; ele segurou o destino nas suas mãos, arriscava tudo numa jogada,tinha a sua própria noção de justiça. Foi rebelde, nunca se deixou subjugar, e foi sempre muito amigo da família. Adorava a irmã Aida ao ponto de ter dado o seu nome à filha.
O cavalo do carabineiro
Terá sido aí por volta de 1937 ou 1938 quando se viviam os tempos inseguros e angustiados da Guerra Civil de Espanha. Zeca, na força dos seus 20 anos, prestava serviço militar na Guarda, seria no Regimento de Infantaria 12, e numa das vindas de licença a S. Pedro foi até Espanha, mais precisamente a Alameda del Gardon. No regresso, pelo caminho mais suavizado que contorna as arripelas e leva a Nave Rodrigo, ao passar junto da ribeira espanhola, seguindo com as cautelas apropriadas para evitar um desagradável encontro, eis que vê dois carabineiros que se alongavam numa sesta para repousar na calmaria de uma tarde de Verão. A pouca distância, as duas montadas da patrulha acarravam, presas, à sombra de uma carrasqueira. Zeca aproximou-se furtivamente dos cavalos, para evitar que os carabineiros o topassem, e, com jeito de tratador, ter-lhe-á afagado as crinas e a garupa, e logo sentiu crescer dentro dele uma súbita e incontrolada tentação: um daqueles cavalos iria acompanha-lo até S. Pedro. Desfeito com facilidade o nó que prendia ao galho, segura a rédea e muito suavemente conduz o cavalo obediente, primeiro muito devagarinho pelo leito da ribeira para não deixar as marcas das ferraduras, depois já mais depressa a caminho da fronteira de Nave Rodrigo.
Não arriscou entrar na aldeia com o saque, procurou evitar encontros desagradáveis, atravessou a folha afastado dos caminhos e foi soltar o cavalo no Prado da Fonte, ali no caminho de Malavado, passada a vinha que é hoje do António Balhessa, que ele conhecia bem, pois por essa altura era pertença da sua mãe Laura. E logo ali congeminou o plano para o dia seguinte.
Levantou-se muito cedo, levou o cavalo para a feira da Lageosa do Mondego – como ele sabia dessa feira eu não sei, mas certo é que terá cavalgado umas boas 12 léguas para lá chegar, uma valente jornada, mesmo em cima de um bom cavalo. Mas estava bem longe do local do “crime” e era isso que o sossegava. Na feira apresentou o cavalo a uns ciganos que muito desdenharam da besta, que parecia ser velha e doente, de donde a trazes, perguntam-lhe, e Zeca já traz a resposta arrumada na cabeça, que os pais vão para o Brasil, estão a desfazer-se de tudo, com muita pena sua tem de vender o cavalo. E lá arrumaram o negócio, teria sido coisa aí para umas dez ou quinze notas, dinheiro grosso para o mancebo que logo dali se foi, caminho do Tintinolho até à Guarda, ansioso por gastar algum dele na Rua do Poço do Gado, onde os rapazes desse tempo embarcavam em viagens por prazeres proibidos.
Já não sei ao certo se terá ido dali para o quartel; mas é pouco tempo depois, já outra vez em S. Pedro, no sossego de uma noite quando estando ele a namorar numa casa da Praça, se não me engano ali onde o Alfeu tinha a oficina de sapateiro, que um grupo de soldados armados o procura e levam para o regimento da Guarda, sob voz de prisão. Pobre Zeca, vai pagar cara a ousadia! O oficial de dia já sabia que ele tinha estado na Lageosa a vender um cavalo a uns ciganos. Ele não podia negar a evidência, estava na disposição de confessar, fosse o que Deus quisesse... Mas, afinal, para grande surpresa sua, estava ilibado e livre! O oficial conta-lhe então que tinha havido uma rixa na feira da Lageosa, um homem aparecera esfaqueado e morto, ele tinha sido reconhecido na feira e apontado como suspeito, mas já estava tudo esclarecido, tinham apanhado o verdadeiro culpado.
E sabes que mais, Zeca – remata o capitão – o cavalo que tu vendeste aos ciganos vieram eles vendê-lo ao quartel. Que belo animal, vê lá se arranjas outros no sítio onde arranjaste este!
Luís
Do casamento de Laura com Sebastião Pinto Teixeira nasceram além de Aida mais três filhos, o mais velho chamava-se Manuel e terá nascido apenas para alimentar as estatísticas de mortalidade infantil, elevada naqueles tempos. Os outros dois, mais novos do que Aida, eram Porfirio António e José que ficariam conhecidos na família pelo tio Toneca e pelo tio Zeca
Este tio Zeca de quem se contam picarescas histórias foi um homem com uma vida recheada. Fica registada neste blog uma dessas histórias que eu próprio recolhi da sua boca. Muita da sua vida se explica pelo facto de desde muito novo ter sido deixado entregue a si próprio; ele segurou o destino nas suas mãos, arriscava tudo numa jogada,tinha a sua própria noção de justiça. Foi rebelde, nunca se deixou subjugar, e foi sempre muito amigo da família. Adorava a irmã Aida ao ponto de ter dado o seu nome à filha.
O cavalo do carabineiro
Terá sido aí por volta de 1937 ou 1938 quando se viviam os tempos inseguros e angustiados da Guerra Civil de Espanha. Zeca, na força dos seus 20 anos, prestava serviço militar na Guarda, seria no Regimento de Infantaria 12, e numa das vindas de licença a S. Pedro foi até Espanha, mais precisamente a Alameda del Gardon. No regresso, pelo caminho mais suavizado que contorna as arripelas e leva a Nave Rodrigo, ao passar junto da ribeira espanhola, seguindo com as cautelas apropriadas para evitar um desagradável encontro, eis que vê dois carabineiros que se alongavam numa sesta para repousar na calmaria de uma tarde de Verão. A pouca distância, as duas montadas da patrulha acarravam, presas, à sombra de uma carrasqueira. Zeca aproximou-se furtivamente dos cavalos, para evitar que os carabineiros o topassem, e, com jeito de tratador, ter-lhe-á afagado as crinas e a garupa, e logo sentiu crescer dentro dele uma súbita e incontrolada tentação: um daqueles cavalos iria acompanha-lo até S. Pedro. Desfeito com facilidade o nó que prendia ao galho, segura a rédea e muito suavemente conduz o cavalo obediente, primeiro muito devagarinho pelo leito da ribeira para não deixar as marcas das ferraduras, depois já mais depressa a caminho da fronteira de Nave Rodrigo.
Não arriscou entrar na aldeia com o saque, procurou evitar encontros desagradáveis, atravessou a folha afastado dos caminhos e foi soltar o cavalo no Prado da Fonte, ali no caminho de Malavado, passada a vinha que é hoje do António Balhessa, que ele conhecia bem, pois por essa altura era pertença da sua mãe Laura. E logo ali congeminou o plano para o dia seguinte.
Levantou-se muito cedo, levou o cavalo para a feira da Lageosa do Mondego – como ele sabia dessa feira eu não sei, mas certo é que terá cavalgado umas boas 12 léguas para lá chegar, uma valente jornada, mesmo em cima de um bom cavalo. Mas estava bem longe do local do “crime” e era isso que o sossegava. Na feira apresentou o cavalo a uns ciganos que muito desdenharam da besta, que parecia ser velha e doente, de donde a trazes, perguntam-lhe, e Zeca já traz a resposta arrumada na cabeça, que os pais vão para o Brasil, estão a desfazer-se de tudo, com muita pena sua tem de vender o cavalo. E lá arrumaram o negócio, teria sido coisa aí para umas dez ou quinze notas, dinheiro grosso para o mancebo que logo dali se foi, caminho do Tintinolho até à Guarda, ansioso por gastar algum dele na Rua do Poço do Gado, onde os rapazes desse tempo embarcavam em viagens por prazeres proibidos.
Já não sei ao certo se terá ido dali para o quartel; mas é pouco tempo depois, já outra vez em S. Pedro, no sossego de uma noite quando estando ele a namorar numa casa da Praça, se não me engano ali onde o Alfeu tinha a oficina de sapateiro, que um grupo de soldados armados o procura e levam para o regimento da Guarda, sob voz de prisão. Pobre Zeca, vai pagar cara a ousadia! O oficial de dia já sabia que ele tinha estado na Lageosa a vender um cavalo a uns ciganos. Ele não podia negar a evidência, estava na disposição de confessar, fosse o que Deus quisesse... Mas, afinal, para grande surpresa sua, estava ilibado e livre! O oficial conta-lhe então que tinha havido uma rixa na feira da Lageosa, um homem aparecera esfaqueado e morto, ele tinha sido reconhecido na feira e apontado como suspeito, mas já estava tudo esclarecido, tinham apanhado o verdadeiro culpado.
E sabes que mais, Zeca – remata o capitão – o cavalo que tu vendeste aos ciganos vieram eles vendê-lo ao quartel. Que belo animal, vê lá se arranjas outros no sítio onde arranjaste este!
Luís
sexta-feira, 17 de julho de 2009
Historias familiares (2)
.
Em novembro de 1905, Maria Reto, ou Reta, ou Maria Recta Doloroza como atesta a escritura, vende a Joaquim Carvalho dos Santos, amigo da familia, tudo o que tem em S. Pedro do Rio Seco para se ir juntar ao marido que já está em Luanda
Terá sido uma venda fictícia (uma venda fantástica, com o já lhe ouvi chamar)? O certo é que mais tarde, de novo em S. Pedro, os bens voltam à posse da família.
Como consequência da ida de Maria Reta para Luanda, a casa de S. Pedro desfez-se; imagino que por essa altura, os filhos mais velhos partiram à procura da sua sorte: Porfirio terá rumado ao Congo Belga e Laureano terá sido engajado pelos ajuntadores espanhois que levavam os emigrantes para Cadiz, a caminho de Buenos Aires. Sem identificação, estes emigrantes passavam por espanhóis (casos do Francisco Queirós, João Carriço e outros). A de Laureano, seria uma viagem sem regresso, ainda havemos de conhecer a sua história. A jovem Laura, teria 16 anos, acompanhou a mãe para Luanda, começava a nascer a lenda.
Veja-se o teor da escritura, obrigado ao Tó Sousa que me arranjou o original.
Escritura de venda, quitação de preço e obrigação
Vendedores- Maria Recta Doloroza por si e como procuradora de seu marido, João Moutinho, este residente em África, Luanda e aquela moradora em São Pedro do Rio Seco,
Comprador- Joaquim Carvalho dos Santos, casado, proprietário e comerciante morador nesta vila de Almeida,
Saibam quantos esta publica escritura de venda quitação e obrigação virem que no ano
do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil novecentos e cinco, aos dezoito dias
dos mês de Novembro do dito ano, nesta Vila de Almeida no meu escritório na Rua Comendador Cardoso, ante mim notário e testemunhas abaixo mencionadas e no fim assinadas, compareceram pessoalmente duma parte como vendedora,
Maria Recta Doloroza, proprietária, moradora na freguesia de São Pedro do Rio Seco desta comarca, esta por si e como procuradora bastante do vendedor seu marido, João Moutinho- este residente em Luanda, África - onde cumpre a pena de degredo- como me fez certo por procuração bastante do mesmo seu marido que neste acto exibiu e eu notário verifiquei conter os poderes precisos para outorgar no presente contrato, a qual fica em meu poder arquivada para poder ser transcrita no translado desta acta, e da outra como comprador,
Joaquim Carvalho dos Santos, casado, comerciante, e proprietário e morador nesta Vila e ambos pessoas cujas identidades pessoalmente conheço e de que dou fé. E, ante mim notário, testemunhas presentes a este acto cujas identidades também reconheço, pela primeira outorgante e vendedora, Maria Recta Doloroza, foi dito:
Que ela e seu marido, João Moutinho, a quem neste acto representa, com procuração bastante deste, são legítimos senhores e pacíficos possuidores dos seguintes bens imóveis:
1) Um Chão no sitio de Vale de Rebolozo que confronta de nascente com Bernardo André bem como poente e Norte e a Sul com herdeiros dos Saraivas das Freixedas
2) Um Chão no sítio denominado de Fonte a confrontar do nascente com Manuel Lourenço da Fonseca, digo Manuel Lourenço Carpinteiro, poente com António Fernandes Sardinha, norte com terreno publico e sul com herdeiros de António Queirós
3) Um prado no sitio de Nave Estevainha confrontando do nascente com terras de João Rosa, poente com Estrada Distrital, de norte com Augusto Garcez e a Sul com herdeiros de João Teles e Francisco Cardoso de Figueiredo
4) Um chão a Nave Rodrigo que confronta de nascente com servidão particular, de poente com Ribeira de Tourões norte com António Lourenço e Sul com Herdeiros de António Martins
5) Dois Hortos no sitio de Vale de Lagares que confrontam de nascente com José Ferreira, de Poente com Agueda Sardinha de norte com Caminho Publico bem com de Sul.
6) Uma morada de casas de altos e baixos com seu curral e palheiro, contíguo à mesma casa na Rua Direita em São Pedro do Rio Seco e que tudo confronta de nascente com José Sardinha de poente norte e Sul com Via Publica.
7) Uma tapada no sítio denominado da Lapa a confrontar de nascente com o Caminho Publico, de Poente com herdeiros de João Teles, Este com caminho público e a Sul com Luiza Limoa, prédios estes todos situados nos limites da freguesia de São Pedro do Rio Seco;
Que estes prédios vieram à posse dela outorgante e seu marido por titulo de compra e de cuja transmissão pagaram a respectiva contribuição de registo e estão os referidos prédios livres de hipoteca, penhores, privilégios e de toda e qualquer responsabilidade em geral, não se achando os mesmos descritos na conservatória desta Comarca como se verifica pela certidão passada pelo conservador do registo predial, sob requerimento, com o numero um de representação do dia de hoje.
Que assim, pela presente escritura, ela outorgante por si e como procuradora bastante de seu marido, e vendedor, vende de pura venda, de hoje para sempre ao segundo outorgante e comprador estes seus designados prédios com suas pertenças, serventias, servidões nativas , logradouros e sucessões
Que esta venda é feita pela quantia de quatrocentos e dezassete mil e quinhentos reis que neste acto ela outorgante recebeu e de que dá, e em nome do vendedor seu marido ao outorgante comprador a correspondente quitação.
Que consequentemente, ela vendedora por si e como procuradora do vendedor seu marido, tira e desiste de ambos todo o domínio, direito e posse que até agora tem tido nos prédios atrás confrontados e agora vendidos e tudo cedem e transferem ao comprador referido a quem também ficam pertencendo todos os frutos pendentes existentes nos prédios agora vendidos ficando também por conta dele outorgante comprador o pagamento das respectivas contribuições vencidas até esta data e ainda não pagas
Declarou ainda ela outorgante,
Que nos termos expostos e no demais que são do direito aplicável, ela outorgante vendedora por si e em nome do vendedor de seu marido de que é bastante procuradora se obriga a fazer esta venda firme e de, por todo o tempo e aceitando a autoria quando a ela for chamada e mais o vendedor seu marido, prestando para tanto a caução de direito
Pelo segundo outorgante e comprador Joaquim Carvalho dos Santos foi dito:
Que aceita esta venda, quitação de preço e obrigação nos termos em que fica acordada e por ele neste acto me foi apresentado o conhecimento da contribuição de registo devida pelo preço da compra a qual tem o número cento e nove dele consta que o mesmo comprador pagou hoje na recebedoria deste concelho a quantia de quarenta e sete mil nove centos e vinte e cinco reis, conhecimento este que fica em meu poder e cartório arquivado para ser transcrito nos translados desta.
Assim o disseram, outorgaram e mutuamente o acordaram ante mim notário e testemunha presentes:
Belmiro José Pereira, casado, amanuense da administração deste concelho e Manuel Gil casado, oficial de diligências deste juízo que assinaram com o outorgante comprador e porque ela outorgante vendedora declara que não sabe escrever assinou a seu rogo, António Manuel José Marcos, casado, proprietário, este residente em São Pedro do Rio Seco. Colo selos da importância de mil duzentos e dez reis devidos por esta. Depois de lida a presente em voz alta ante todos os mencionados nesta, por mim Camilo Augusto da Fonseca, notário Publico, que a escrevi e também assino em público e viso
Ass.
António Manuel José Marcos
Joaquim Carvalho dos Santos
Belmiro José Pereira
Manuel Gil
O notário: Camilo Augusto da Fonseca
publicado por Luis
Em novembro de 1905, Maria Reto, ou Reta, ou Maria Recta Doloroza como atesta a escritura, vende a Joaquim Carvalho dos Santos, amigo da familia, tudo o que tem em S. Pedro do Rio Seco para se ir juntar ao marido que já está em Luanda
Terá sido uma venda fictícia (uma venda fantástica, com o já lhe ouvi chamar)? O certo é que mais tarde, de novo em S. Pedro, os bens voltam à posse da família.
Como consequência da ida de Maria Reta para Luanda, a casa de S. Pedro desfez-se; imagino que por essa altura, os filhos mais velhos partiram à procura da sua sorte: Porfirio terá rumado ao Congo Belga e Laureano terá sido engajado pelos ajuntadores espanhois que levavam os emigrantes para Cadiz, a caminho de Buenos Aires. Sem identificação, estes emigrantes passavam por espanhóis (casos do Francisco Queirós, João Carriço e outros). A de Laureano, seria uma viagem sem regresso, ainda havemos de conhecer a sua história. A jovem Laura, teria 16 anos, acompanhou a mãe para Luanda, começava a nascer a lenda.
Veja-se o teor da escritura, obrigado ao Tó Sousa que me arranjou o original.
Escritura de venda, quitação de preço e obrigação
Vendedores- Maria Recta Doloroza por si e como procuradora de seu marido, João Moutinho, este residente em África, Luanda e aquela moradora em São Pedro do Rio Seco,
Comprador- Joaquim Carvalho dos Santos, casado, proprietário e comerciante morador nesta vila de Almeida,
Saibam quantos esta publica escritura de venda quitação e obrigação virem que no ano
do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil novecentos e cinco, aos dezoito dias
dos mês de Novembro do dito ano, nesta Vila de Almeida no meu escritório na Rua Comendador Cardoso, ante mim notário e testemunhas abaixo mencionadas e no fim assinadas, compareceram pessoalmente duma parte como vendedora,
Maria Recta Doloroza, proprietária, moradora na freguesia de São Pedro do Rio Seco desta comarca, esta por si e como procuradora bastante do vendedor seu marido, João Moutinho- este residente em Luanda, África - onde cumpre a pena de degredo- como me fez certo por procuração bastante do mesmo seu marido que neste acto exibiu e eu notário verifiquei conter os poderes precisos para outorgar no presente contrato, a qual fica em meu poder arquivada para poder ser transcrita no translado desta acta, e da outra como comprador,
Joaquim Carvalho dos Santos, casado, comerciante, e proprietário e morador nesta Vila e ambos pessoas cujas identidades pessoalmente conheço e de que dou fé. E, ante mim notário, testemunhas presentes a este acto cujas identidades também reconheço, pela primeira outorgante e vendedora, Maria Recta Doloroza, foi dito:
Que ela e seu marido, João Moutinho, a quem neste acto representa, com procuração bastante deste, são legítimos senhores e pacíficos possuidores dos seguintes bens imóveis:
1) Um Chão no sitio de Vale de Rebolozo que confronta de nascente com Bernardo André bem como poente e Norte e a Sul com herdeiros dos Saraivas das Freixedas
2) Um Chão no sítio denominado de Fonte a confrontar do nascente com Manuel Lourenço da Fonseca, digo Manuel Lourenço Carpinteiro, poente com António Fernandes Sardinha, norte com terreno publico e sul com herdeiros de António Queirós
3) Um prado no sitio de Nave Estevainha confrontando do nascente com terras de João Rosa, poente com Estrada Distrital, de norte com Augusto Garcez e a Sul com herdeiros de João Teles e Francisco Cardoso de Figueiredo
4) Um chão a Nave Rodrigo que confronta de nascente com servidão particular, de poente com Ribeira de Tourões norte com António Lourenço e Sul com Herdeiros de António Martins
5) Dois Hortos no sitio de Vale de Lagares que confrontam de nascente com José Ferreira, de Poente com Agueda Sardinha de norte com Caminho Publico bem com de Sul.
6) Uma morada de casas de altos e baixos com seu curral e palheiro, contíguo à mesma casa na Rua Direita em São Pedro do Rio Seco e que tudo confronta de nascente com José Sardinha de poente norte e Sul com Via Publica.
7) Uma tapada no sítio denominado da Lapa a confrontar de nascente com o Caminho Publico, de Poente com herdeiros de João Teles, Este com caminho público e a Sul com Luiza Limoa, prédios estes todos situados nos limites da freguesia de São Pedro do Rio Seco;
Que estes prédios vieram à posse dela outorgante e seu marido por titulo de compra e de cuja transmissão pagaram a respectiva contribuição de registo e estão os referidos prédios livres de hipoteca, penhores, privilégios e de toda e qualquer responsabilidade em geral, não se achando os mesmos descritos na conservatória desta Comarca como se verifica pela certidão passada pelo conservador do registo predial, sob requerimento, com o numero um de representação do dia de hoje.
Que assim, pela presente escritura, ela outorgante por si e como procuradora bastante de seu marido, e vendedor, vende de pura venda, de hoje para sempre ao segundo outorgante e comprador estes seus designados prédios com suas pertenças, serventias, servidões nativas , logradouros e sucessões
Que esta venda é feita pela quantia de quatrocentos e dezassete mil e quinhentos reis que neste acto ela outorgante recebeu e de que dá, e em nome do vendedor seu marido ao outorgante comprador a correspondente quitação.
Que consequentemente, ela vendedora por si e como procuradora do vendedor seu marido, tira e desiste de ambos todo o domínio, direito e posse que até agora tem tido nos prédios atrás confrontados e agora vendidos e tudo cedem e transferem ao comprador referido a quem também ficam pertencendo todos os frutos pendentes existentes nos prédios agora vendidos ficando também por conta dele outorgante comprador o pagamento das respectivas contribuições vencidas até esta data e ainda não pagas
Declarou ainda ela outorgante,
Que nos termos expostos e no demais que são do direito aplicável, ela outorgante vendedora por si e em nome do vendedor de seu marido de que é bastante procuradora se obriga a fazer esta venda firme e de, por todo o tempo e aceitando a autoria quando a ela for chamada e mais o vendedor seu marido, prestando para tanto a caução de direito
Pelo segundo outorgante e comprador Joaquim Carvalho dos Santos foi dito:
Que aceita esta venda, quitação de preço e obrigação nos termos em que fica acordada e por ele neste acto me foi apresentado o conhecimento da contribuição de registo devida pelo preço da compra a qual tem o número cento e nove dele consta que o mesmo comprador pagou hoje na recebedoria deste concelho a quantia de quarenta e sete mil nove centos e vinte e cinco reis, conhecimento este que fica em meu poder e cartório arquivado para ser transcrito nos translados desta.
Assim o disseram, outorgaram e mutuamente o acordaram ante mim notário e testemunha presentes:
Belmiro José Pereira, casado, amanuense da administração deste concelho e Manuel Gil casado, oficial de diligências deste juízo que assinaram com o outorgante comprador e porque ela outorgante vendedora declara que não sabe escrever assinou a seu rogo, António Manuel José Marcos, casado, proprietário, este residente em São Pedro do Rio Seco. Colo selos da importância de mil duzentos e dez reis devidos por esta. Depois de lida a presente em voz alta ante todos os mencionados nesta, por mim Camilo Augusto da Fonseca, notário Publico, que a escrevi e também assino em público e viso
Ass.
António Manuel José Marcos
Joaquim Carvalho dos Santos
Belmiro José Pereira
Manuel Gil
O notário: Camilo Augusto da Fonseca
publicado por Luis
A minha prima e cunhada Aida Teixeira
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Nunca é de mais relembrar os predicados que nós lhe reconhecemos; e ao reconhecer-lhos sentimos que também neles nos cabe uma parcela, o que nos envaidece e envolve de saudade.
Destaco o grau de inteligência de que era dotada e que lhe permitiu tudo resolver dentro das contrariedades que na vida enfrentou; a coragem a persistência no trabalho, alicerçados pela robustez do seu comportamento de mulher, mãe e esposa. O seu marido, pessoa simples, confiava nela infinitamente, ela era a sua força e o farol de uma vida que, em pacífica união, lhes permitiu rasgar o horizonte dos quatro filhos que educaram no exemplo de trabalho, da dignidade e da correcção no pensamento e na postura: e assim deles fizeram quatro Homens
Estes filhos viram sua mãe amassar e cozer o pão que os alimentava; eles viram a sua mãe atender no comércio sempre com a presença altiva e perspicaz, com as maneiras senhoris que o berço lhe deu.
Era morena e simpática; tinha a bondade de aconchegar, quem não pudesse pagar-lhe, com um almoço carinhoso. Um gesto caloroso e amigo como que a contrastar com as temperaturas agrestes dos longos invernos da Guarda; tinha sempre a palavra amiga e sensata, com a finura da sua experiencia arguta, e o galanteio de uma forma de ser que só cativava e granjeava amizades.
Na Aidinha, era admirável a forma como se impunha. Ela sabia distinguir as coisas da vida e resolver os problemas sempre no âmbito da diplomacia dentro do trajo com que venceu pelo trabalho e fez a fartura de uma casa de seis pessoas.
Sempre a conheci erguida, sem manifestação de mágoa no coração, mesmo quando teve despedir-se do seu chapéu e luvas cerimoniais para os trocar pelo xaile e lenço que a vida lhe impôs.
Pena foi ter partido tão cedo. Mas quando Deus nos dá a libertação do final da vida, chega o momento de agradecer o legado exemplar de uma existência sublime, configurada nesta mulher e mãe.
Maria de Fátima Moutinho Borges
Nunca é de mais relembrar os predicados que nós lhe reconhecemos; e ao reconhecer-lhos sentimos que também neles nos cabe uma parcela, o que nos envaidece e envolve de saudade.
Destaco o grau de inteligência de que era dotada e que lhe permitiu tudo resolver dentro das contrariedades que na vida enfrentou; a coragem a persistência no trabalho, alicerçados pela robustez do seu comportamento de mulher, mãe e esposa. O seu marido, pessoa simples, confiava nela infinitamente, ela era a sua força e o farol de uma vida que, em pacífica união, lhes permitiu rasgar o horizonte dos quatro filhos que educaram no exemplo de trabalho, da dignidade e da correcção no pensamento e na postura: e assim deles fizeram quatro Homens
Estes filhos viram sua mãe amassar e cozer o pão que os alimentava; eles viram a sua mãe atender no comércio sempre com a presença altiva e perspicaz, com as maneiras senhoris que o berço lhe deu.
Era morena e simpática; tinha a bondade de aconchegar, quem não pudesse pagar-lhe, com um almoço carinhoso. Um gesto caloroso e amigo como que a contrastar com as temperaturas agrestes dos longos invernos da Guarda; tinha sempre a palavra amiga e sensata, com a finura da sua experiencia arguta, e o galanteio de uma forma de ser que só cativava e granjeava amizades.
Na Aidinha, era admirável a forma como se impunha. Ela sabia distinguir as coisas da vida e resolver os problemas sempre no âmbito da diplomacia dentro do trajo com que venceu pelo trabalho e fez a fartura de uma casa de seis pessoas.
Sempre a conheci erguida, sem manifestação de mágoa no coração, mesmo quando teve despedir-se do seu chapéu e luvas cerimoniais para os trocar pelo xaile e lenço que a vida lhe impôs.
Pena foi ter partido tão cedo. Mas quando Deus nos dá a libertação do final da vida, chega o momento de agradecer o legado exemplar de uma existência sublime, configurada nesta mulher e mãe.
Maria de Fátima Moutinho Borges
A minha tia Aida
Não poderei falar muito da tia Aida, eu convivi pouco com ela mas ela gostava de mim e acho que até tinha muita pena de mim. Mesmo assim tenho algumas boas lembranças. É algo que me foi contado com saudade e grande amizade. A minha mãe e ela fizeram o exame de admissão ao liceu juntas na Guarda. A amizade entre Salomé e Aida já era antiga de alguns anos de escola, eram muito confidentes. Os tios Borges, os seus irmãos mais novos, eram muito mais novos.
O tio Queirós visitava-nos sempre que ia a Vilar Formoso e até ofereceu o terço da tia à minha mãe e uma jarra africana, já um pouco partida, à afilhada Aida que em alturas festivas ela coloca na mesa com cravos. O António e Norberto não me deixarão mentir. Foi com eles que eu a conheci melhor. O Armando era mais novo e do Luís só me lembro de o ver, em casa, vestido de estudante.
A primeira vez que me lembro da tia foi quando nasceu a minha irmã Aida. Estava a tia e a Celestininha a combinar o nome para a menina. Ela nasceu no dia oito de Dezembro. Puseram-lhe por isso o nome da madrinha e o da data: ficou Aida da Conceição.
A tia Aida era uma senhora muito interessante, morena, cabelos pretos, lisos. Guardo uma foto dela em pequenita: era igual à minha irmã naquela idade, até se diria a mesma pessoa. Nessa foto está a nossa bisavó, o meu pai ao colo e a avó Laura e ela, com uma flor na mão. Julgo ser no baptizado do meu pai, Porfírio António, a quem chamavam Toneca, e que adorava a irmã.
O meu pai cantava para nós à lareira uma cantiga que a tia em pequenos lhe ensinou. Era muito nosso amigo. A sorte não o favoreceu mas era estimado e, no seu último dia, não lhe faltaram os grandes de Vilar Formosos até à sua última morada
Era esta a canção, que ele cantava muito para a minha irmã Aida:
Nossa senhora faz meia
Com linha feita de luz
O novelo é lua cheia
As meias são para Jesus…
E, quando cantava, chorava e esforçava a voz:
Deixem o rouxinol cantar
Não o prendam, deixem-no voar
Ele ama os seus rouxinoizinhos a chiar
A minha avó Ana, de S. Pedro, mandava-me, às vezes, a casa da Tia. Eu merendava lá as deliciosas torradas de pão caseiro feito por ela que sendo uma senhora bonita era muito trabalhadora e muito inteligente.
O primo António deve também lembrar-se destas visitas. Com o Norberto íamos os três à casa do padrinho Norberto e da madrinha Lucília que tinha olhos bonitos e era como uma irmã da tia.
Mais tarde voltei a estar com a tia Aida e a tia Luísa, de passagem em Vilar Formoso, vestia ela um casaco comprido e tinha os cabelos pretos apanhados.
A última vez que estive com a tia Aida foi na Guarda quando a Sara Rico de São Pedro me levou para lá para sofrer duas operações no hospital. Eu tomava o leite com a tia e o primo Norberto acompanhava-me a casa da Sara, querida amiga e tia de outras duas grandes amigas que eram a Lídia e a Maria. Ia visitar-me ao hospital, levava rebuçados para mim, e até as freiras comiam. Também quando estive na casa dos pais da minha professora na Guarda, ia com ela fazer compras na Véritas. Outras vezes ia visitá-la e também tomava leite com ela: Via como era bastante amiga das pessoas que iam à loja. As mulheres do povo de Vilar Formoso contavam o bem que ela lhes fazia. Acredito que muitas vezes contrariada mas ela era uma grande senhora. Lembro-me com carinho, com saudade amiga
Foi pena ela ter morrido tão cedo. Sempre que me é possível ouço missa por ela e por todos os que já partiram e levo flores ao Senhor da Paz.
Maria Helena Campos Teixeira
O tio Queirós visitava-nos sempre que ia a Vilar Formoso e até ofereceu o terço da tia à minha mãe e uma jarra africana, já um pouco partida, à afilhada Aida que em alturas festivas ela coloca na mesa com cravos. O António e Norberto não me deixarão mentir. Foi com eles que eu a conheci melhor. O Armando era mais novo e do Luís só me lembro de o ver, em casa, vestido de estudante.
A primeira vez que me lembro da tia foi quando nasceu a minha irmã Aida. Estava a tia e a Celestininha a combinar o nome para a menina. Ela nasceu no dia oito de Dezembro. Puseram-lhe por isso o nome da madrinha e o da data: ficou Aida da Conceição.
A tia Aida era uma senhora muito interessante, morena, cabelos pretos, lisos. Guardo uma foto dela em pequenita: era igual à minha irmã naquela idade, até se diria a mesma pessoa. Nessa foto está a nossa bisavó, o meu pai ao colo e a avó Laura e ela, com uma flor na mão. Julgo ser no baptizado do meu pai, Porfírio António, a quem chamavam Toneca, e que adorava a irmã.
O meu pai cantava para nós à lareira uma cantiga que a tia em pequenos lhe ensinou. Era muito nosso amigo. A sorte não o favoreceu mas era estimado e, no seu último dia, não lhe faltaram os grandes de Vilar Formosos até à sua última morada
Era esta a canção, que ele cantava muito para a minha irmã Aida:
Nossa senhora faz meia
Com linha feita de luz
O novelo é lua cheia
As meias são para Jesus…
E, quando cantava, chorava e esforçava a voz:
Deixem o rouxinol cantar
Não o prendam, deixem-no voar
Ele ama os seus rouxinoizinhos a chiar
A minha avó Ana, de S. Pedro, mandava-me, às vezes, a casa da Tia. Eu merendava lá as deliciosas torradas de pão caseiro feito por ela que sendo uma senhora bonita era muito trabalhadora e muito inteligente.
O primo António deve também lembrar-se destas visitas. Com o Norberto íamos os três à casa do padrinho Norberto e da madrinha Lucília que tinha olhos bonitos e era como uma irmã da tia.
Mais tarde voltei a estar com a tia Aida e a tia Luísa, de passagem em Vilar Formoso, vestia ela um casaco comprido e tinha os cabelos pretos apanhados.
A última vez que estive com a tia Aida foi na Guarda quando a Sara Rico de São Pedro me levou para lá para sofrer duas operações no hospital. Eu tomava o leite com a tia e o primo Norberto acompanhava-me a casa da Sara, querida amiga e tia de outras duas grandes amigas que eram a Lídia e a Maria. Ia visitar-me ao hospital, levava rebuçados para mim, e até as freiras comiam. Também quando estive na casa dos pais da minha professora na Guarda, ia com ela fazer compras na Véritas. Outras vezes ia visitá-la e também tomava leite com ela: Via como era bastante amiga das pessoas que iam à loja. As mulheres do povo de Vilar Formoso contavam o bem que ela lhes fazia. Acredito que muitas vezes contrariada mas ela era uma grande senhora. Lembro-me com carinho, com saudade amiga
Foi pena ela ter morrido tão cedo. Sempre que me é possível ouço missa por ela e por todos os que já partiram e levo flores ao Senhor da Paz.
Maria Helena Campos Teixeira
Histórias familiares (1)
.Laura e Sebastião
Aida Teixeira foi buscar a sua nobreza ao ramo da Mata, enxertado no tronco dos judeus que procuraram aquelas terras quando foram enxotados da Estremadura espanhola, possivelmente de Hervas, pelos reis católicos. Basta olhar para o perfil do tio Porfírio ou para o da avó Maria Reto para perceber isso; mesmo o tio Laureano revela essa nobreza na fotografia tardia que o Juan Carlos nos trouxe.
Do seu pai, Sebastião, pouco se sabe e o que sabe não é muito abonatório, era ciumento, artista sapateiro porventura falhado, presumo enjeitado pela família, teve a pouca sorte de sucumbir novo no surto da pneumónica em Agosto de 1918, dizia ter 43 anos pela certidão de óbito mas a certidão de nascimento atestava 47, terá ele subtraído uns anos para justificar o casamento com a bela e jovem Laura.
Tenho um depoimento através da prima Helena, que diz que Sebastião era cliente duma pensão/hotel que o João Moutinho, pai de Laura, tinha em Luanda e que raptou a jovem para casar com ela, consumando deste modo o seu desiderato, para grande desgosto da bisavó Reto e do João Moutinho. Este João, alcunhado de Roseirão pela sua bela figura, estava desterrado em Luanda, por crime de homicídio, processo que mal conheço e gostaria de conhecer. Diz o Tó Sousa que o processo se perdeu num incêndio dos arquivos judiciais militares, ele era guarda fiscal, pena que não possamos perceber os motivos, isso podia ajudar a conhecer melhor a nossa família.
Luís
Aida Teixeira foi buscar a sua nobreza ao ramo da Mata, enxertado no tronco dos judeus que procuraram aquelas terras quando foram enxotados da Estremadura espanhola, possivelmente de Hervas, pelos reis católicos. Basta olhar para o perfil do tio Porfírio ou para o da avó Maria Reto para perceber isso; mesmo o tio Laureano revela essa nobreza na fotografia tardia que o Juan Carlos nos trouxe.
Do seu pai, Sebastião, pouco se sabe e o que sabe não é muito abonatório, era ciumento, artista sapateiro porventura falhado, presumo enjeitado pela família, teve a pouca sorte de sucumbir novo no surto da pneumónica em Agosto de 1918, dizia ter 43 anos pela certidão de óbito mas a certidão de nascimento atestava 47, terá ele subtraído uns anos para justificar o casamento com a bela e jovem Laura.
Tenho um depoimento através da prima Helena, que diz que Sebastião era cliente duma pensão/hotel que o João Moutinho, pai de Laura, tinha em Luanda e que raptou a jovem para casar com ela, consumando deste modo o seu desiderato, para grande desgosto da bisavó Reto e do João Moutinho. Este João, alcunhado de Roseirão pela sua bela figura, estava desterrado em Luanda, por crime de homicídio, processo que mal conheço e gostaria de conhecer. Diz o Tó Sousa que o processo se perdeu num incêndio dos arquivos judiciais militares, ele era guarda fiscal, pena que não possamos perceber os motivos, isso podia ajudar a conhecer melhor a nossa família.
Luís
quarta-feira, 15 de julho de 2009
Abertura
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Esta é a primeira mensagem que coloco neste blog.
Faço-o para apresentar a Dona deste blog, Maria Aida Pinto Teixeira, que era a minha mãe. Este blog nasce para evocar a memória duma mulher especial, claro, eu sou parte interessada para dizer isso, mas espero que neste espaço apareçam depoimentos que me venham a dar razão.
Nasceu em 28 de agosto de 1912, na cidade da Praia, em Cabo Verde. Não sei o que terá levado os seus pais, Sebastião Pinto Teixeira, natural de Sande, Lamego e Laura dos Anjos àquelas paragens. Talvez ainda encontremos uma explicação.
Luís
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