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O Norberto é chamado a depor
Passados tantos anos, não me é fácil transpor para o papel as recordações da minha MÃE, uma MÃE com um coração dócil, afável e bondoso. A minha memória recua aos tempos em que ela sozinha, por ausência do meu pai, em África, onde fora ganhar o sustento para a família, educava quatro filhos, crianças a caminho da adolescência, talvez nas idades mais difíceis de educar.
Das muitas recordações que me deixou posso relatar algumas que mostram um pouco aquilo que ela era.
Éramos ainda pequenos quando eu e o meu irmão Armando fomos aos figos para o curral da avó Cândida Queiroz e eu caí da figueira para o poço, que ainda hoje lá está.
Não me afoguei porque o poço tinha pouca água, mas fiquei no fundo desmaiado. O meu irmão correu a chamar a minha MÃE que estava a lavar roupa num tanque do ti António Gomes, ali para os lados do Calvário.
Quando chegou, aflita, já alguém me tinha tirado do poço e tomado a iniciativa de mandar chamar o Dr. Casimiro, médico de Almeida; o mensageiro fez o favor de se deslocar de bicicleta que era o meio de comunicação mais rápido que existia lá na terra naquela altura.
Uns anos antes tinha sido o Armando a cair naquele mesmo poço, quando brincava comigo, e eu gritei “ai, coitadinho afogou-se”.
Também, noutra ocasião, o meu irmão António me salvou de morrer afogado no horto do “Malavado” quando caí para o poço dos Morgados, após termos sachado ou mondado as batatas. Ainda tentámos secar a roupa para esconder à nossa MÃE o que tinha acontecido mas sem sucesso; devido á sua astúcia não demorou a descobrir o acontecido.
Terei eu este destino de cair aos poços?
Quando alguns de nós fazia algo de mal como aparecer em casa com os calções rotos de escorregar na Lancha do Forte o castigo que ela nos dava era atar-nos com uma linha de coser a uma perna da mesa da sala. Durante algum tempo ali ficávamos, sempre quietinhos, obedientes, resignados.
Foi esposa dedicada e colaborante de barbeiro, carniceiro, taberneiro actividades que sempre desempenhou com coragem e abnegação.
Foi na actividade comercial na Guarda onde mais se notabilizou: fazia tudo: era cozinheira, taberneira arrumadora de quartos etc. Dotada de uma psicologia muito especial, não era necessário muito tempo para saber como lidar com o próximo de forma sempre respeitadora e respeitada. Por alguns era tratada por D. Aida por outros por Senhora Aida e ainda havia uma minoria, os que tinham mais confiança e amizade para quem era a Ti Aida.
Durante várias décadas a nossa família ficou e ficará com história na Guarda devido muito á bondade de minha MÃE. Estava sempre de coração aberto para quem quer que fosse: lembro-me que clientes como Srs. Pinho, Mineiro, Bidarra da Soc. Transportes, “maleiros” e tantos outros quando iam “matar o bicho” não podiam passar sem ir à cozinha ver a minha MÃE já com intenção de provarem um petisco da ementa do dia, ela já os conhecia muito bem.
Foi pena o destino tê-la levado tão cedo. Imagino muitas vezes como teria sido como sogra, - das noras apenas conheceu a minha mulher Emília -, e como avó, quanto ela teria gostado de ver os netos!
Haveria imensas coisas boas para relatar. As suas memórias dariam um belíssimo romance, a sua vida um exemplo a seguir.
Norberto
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