domingo, 16 de agosto de 2009

Memórias da Alma

A primeira vez que fui a S. Pedro o rio ia seco. Era Verão, numa das muitas férias que nos deslocavam da Invicta até Almeida, onde a família está radicada, e interligada, desde o séc. XVIII. Na altura a minha admiração, e recordo-me, foi de estupefacção, apesar da tenra idade que tinha, pois estava habituado a planar o olhar na turbulência das águas que ladeiam as margens do Porto e de Gaia: para mim todos os rios eram assim e aquele não.

O rio corria seco, bordejando nas margens uma vegetação que teimava em sobreviver, e questionava-me das causas e motivos pelo qual S. Pedro, o primeiro Papa da nossa igreja, não enchia aquele regato para deleite da massa humana que ali habitava.

O meu pai nasceu em S. Pedro, e baptizaram-no de Elias. O sobrenome Augusto foi-lhe dado em memória do tio Porfírio Augusto, irmão da mãe Laura, que casou, após viuvez, com António Baptista Borges, natural de Rebordãos, aldeia distante de Bragança, cerca de 6Km. Também o meu nome e sobrenome do meu irmão Américo seguem nessa tradição, associados ao ramo transmontano.

Vivíamos no Porto, cidade que acolheu minha mãe, Maria de Fátima, após casamento com o seu primo Elias. Lá se encontravam alguns tios, a Albina, a Luísa e o Manuel, assim como os seus filhos, primos com quem deambulávamos pela urbe, tendo sempre como referência a Laurinha, a minha irmã mais velha.

Quando vínhamos a Almeida, e recordo-me, íamos visitar a tia Aida à Guarda. Estacionávamos num largo, frente a um edifício revestido com azulejos avermelhados, e íamos cumprimentar os tios. De quem eu mais me lembro é do tio Norberto. Alto, muito alto, era para mim um mistério. A imagem que tenho dos meus primos é tardia, mas sempre se falava neles. Do António identificava-o como residindo na casa que foi do Marechal Carmona, em Lisboa, do Norberto a sua ligação à cidade da Covilhã, o Armando como inseparável da Fátima e do Luís a memória associava-o a um FIAT 600, carro que uma vez levou ao Porto e onde, teria alguns 7 anitos, me levou a passear e segurar no volante: foi para nunca mais esquecer.

A tia Aida, apesar da sua reduzida estatura, era, sem dúvida, o esteio do núcleo familiar, na tradição do exemplo da avó Maria Retta, que juntamente com o avô João Moutinho (naturais da Mata de Lobos, concelho de Figueira de Castelo Rodrigo) remaram contra as contrariedades da vida, mas que quiseram, tal como a neta, repousar em S. Pedro, onde o rio vai, normalmente, seco.


Augusto Moutinho Borges

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